A rápida destruição do bioma do Cerrado está golpeando a gigantesca rede de raízes que atua como uma esponja, ajudando a recarregar os aquíferos que levam água a torneiras de todas as regiões do Brasil.
A água que alimenta o São Francisco e as represas de São Paulo e Brasília vem de três grandes depósitos subterrâneos no Cerrado: os aquíferos Guarani, Urucuia e Bambuí.
Os aquíferos são reabastecidos pela chuva, mas dependem da vegetação para que a água chegue lá embaixo.
A observação em tom de alerta é do arqueólogo e antropólogo baiano Altair Sales Barbosa, que há quase 50 anos estuda o papel do Cerrado na regulação de grandes rios da América do Sul.
“Se você arrancar uma dessas plantas, vai contar milhares ou até milhões de raízes, e quando cortar uma raiz e levá-la ao microscópio, verá inúmeras outras minirraízes que se entrelaçam com as de outras plantas, formando uma espécie de esponja”, disse ele em entrevista a João Feilet da BBC Brasil.
O professor diz que essa dinâmica começou a ser afetada radicalmente nos anos 1970, com a expansão da pecuária e de grandes plantações de grãos e algodão pelo Cerrado. A nova vegetação tem raízes curtas e não consegue transportar a água para o fundo.
Ele diz ter presenciado o fenômeno num dos principais afluentes do São Francisco, o rio Grande, cuja nascente teria migrado quase 100 quilômetros a jusante desde 1970.
O mesmo se deu, segundo Barbosa, nos chapadões no oeste da Bahia e de Minas Gerais: com a retirada da cobertura vegetal, vários rios que vertiam água para o São Francisco e o Tocantins sumiram.