Onde hoje assenta a capital do Cazaquistão, Astana, nada existia há apenas 20 anos. Em 1997, o (ainda) presidente Nursultan Nazarbayev ordenou a transferência da capital do país para uma nova urbe, que deveria ser construída de raiz para o efeito, argumentando não ser do seu agrado a proximidade de Almaty — a antiga capital — com a fronteira chinesa.
O local por ele indicado para a construção da nova metrópole seria o centro de uma vastíssima extensão de estepe, no Norte do país, onde não havia vestígio de presença humana.
Astana brotou expressivamente da terra, rugindo cimento, metal e vidro luzente, no espaço de poucos anos. Muitos milhares de milhões de dólares provenientes da receita da extração de petróleo, o principal sustento da economia cazaque, deram forma ao plano diretor municipal.
O projeto foi delineado pelo japonês Kisho Kurokawa, que se baseou numa tese filosófica de desenvolvimento urbanístico criada pelo próprio: a chamada “arquitetura de simbiose”.
Kurokawa faleceu em 2007 deixando para trás um plano que deveria ficar concluído apenas em 2030; entretanto, o projeto já sofreu inúmeras alterações que nem sempre vão ao encontro do que foi delineado pelo arquiteto nipónico.
Apesar da ínfima população de 16 milhões — tendo em conta a área do país, que corresponde a 30 vezes a área de Portugal continental – e da enorme margem de lucro do Estado, proveniente da exportação do barris de petróleo e de gás natural, a riqueza não chega a todos os habitantes do Cazaquistão.
Em Astana, torna-se claro o motivo por que tal se verifica. O investimento público é estonteante e a abundância e a opulência são uma linguagem omnipresente no tecido urbano da cidade.
O fotógrafo israelita Tomer Ifrah, o autor da série Planned City, contou ao Público (P3), em entrevista, que “caminhar nas ruas de Astana é surreal”. “Por um lado, a arquitetura é exuberante, os edifícios são grandiosos, os centros comerciais são colossais, mas, ao mesmo tempo, há um silêncio solene em todos os locais.
Por vezes, caminhava em partes da cidade onde não via absolutamente ninguém na rua.” Ifrah descreve a capital do Cazaquistão como “uma estranha combinação entre extravagância e silêncio”, como um gesto de um grito inaudível. O fotógrafo esteve em Astana em julho e outubro de 2017 e confessa ter sido seduzido pela ideia de uma cidade construída de raiz a partir de um plano diretor, como Washington D.C., Camberra ou Brasília.
Astana foi construída com o intuito de se tornar um exemplo de excelência urbanística; um exemplo de sofisticação, de vanguardismo.
Frank Albo, historiador de arquitetura e autor do livro “Astana: Arquitecture, Myth and Destiny”, descreve a cidade da seguinte forma: “Vê-se uma mistura de pós-modernismo com correntes de arte da Ásia Central, toques de decoração muçulmana, de barroco russo, de neoclassicismo e orientalismo, todas combinadas numa espécie de Las Vegas meets Disneyland sob influência de esteróides nacionalistas.”
A cidade está repleta de arranha-céus — o maior encontra-se em construção, terá 88 andares e uma estrada-de-ferro privativoa para o aeroporto. Por outro lado, existem também referências claras ao passado e à tradição nómada na arquitetura local: o centro comercial Khan Shatyr, por exemplo, foi desenhado pelo arquiteto inglês Norman Foster com o intuito de aludir às tendas dos nómadas cazaques. Por dentro, ao invés, é um edifício luxuoso que contém uma praia artificial cuja areia foi importada das ilhas Maldivas. (Do Público)