O ordoliberalismo é uma teoria econômica bastante difundida na Alemanha, mas pouco conhecida em outros países. Trata-se de um ramo do liberalismo que defende a competição e a livre iniciativa, mas com um Estado que garanta igualdade de oportunidades e uma moeda estável e que combata monopólios – “ordo” vem de “ordem”.
Esse sistema foi proposto nos anos 1930 por professores da Universidade de Freiburg, no sudoeste da Alemanha, e aplicado na prática pelos primeiros governos alemães após a Segunda Guerra, na década de 1950, quando o país vivenciou seu “milagre econômico”.
Outra regra do ordoliberalismo, de inspiração protestante, é que cada um deve ser responsável por suas ações e colher os frutos de seu trabalho ou arcar com os prejuízos de suas escolhas.
A teoria ainda tem seguidores no governo alemão e foi citada para justificar posições austeras do país em relação a nações europeias em dificuldade — como a Grécia após a crise do euro em 2008 e a Itália de hoje.
Segundo esse raciocínio, Estados europeus em crise deveriam se esforçar mais para organizar suas contas em vez de pedir “solidariedade” dos vizinhos mais ricos.
A influência sobre Roberto Campos – No Brasil, um admirador do ordoliberalismo foi o economista Roberto Campos, ministro do Planejamento de 1964 a 1967, nos primeiros anos do regime militar.
Em livro publicado em 1963, Campos demonstra simpatia pela teoria e propõe trazê-la para a realidade brasileira, diz Caroline Rippe, professora da Universidade Federal da Fronteira Sul, em Erechim (RS), que pesquisa o tema.
Transplantar o ordoliberalismo para o Brasil em 1963, contudo, seria pouco provável. Além das diferenças estruturais entre os dois países, o presidente era João Goulart, cujas reformas de base aumentavam a intervenção do Estado na economia.
No ano seguinte, Jango foi deposto por um golpe, teve início a ditadura militar e Campos foi nomeado ministro do Planejamento pelo presidente Castelo Branco.
Segundo Rippe, que analisou documentos na Alemanha e no Brasil, o primeiro plano econômico anunciado por Campos, conhecido como Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG), tinha algumas semelhanças com as medidas adotadas por Adenauer e Erhard, especialmente quanto a combate à inflação, fortalecimento da moeda e incentivo à livre iniciativa.
Mas havia uma diferença fundamental entre o modelo que Campos admirava e o plano que ele elaborou para o Brasil: enquanto a Alemanha vivenciava uma democracia, o Brasil era governado por uma ditadura.
“O ordoliberalismo se encaixa no regime democrático, tem sua raiz no liberalismo. Não se justificaria numa ditadura, onde não há liberdades individuais”, considera Rippe.
Como surgiu a teoria – O ordoliberalismo foi elaborado por três professores protestantes que almejavam um sistema liberal e democrático que levasse a Alemanha ao progresso econômico. Assinam o manifesto fundador, publicado em 1936, o economista Walter Eucken e os juristas Franz Böhm e Hans Großmann-Doerth.
Na época, o país tinha acabado de sair do período conhecido como República de Weimar, na qual monopólios, proximidade excessiva entre empresas e governo e hiperinflação, combinados com desorganização política, provocaram crise social e facilitaram a chegada de Adolf Hitler ao poder.
Para os autores do manifesto ordoliberal, a melhor alternativa para a Alemanha seria um governo que não interviesse na economia, mas estimulasse a competição, para permitir a realização da autonomia e da capacidade pessoal de cada um, e garantisse igualdade de oportunidades.
“Uma metáfora que ajuda a explicar o ordoliberalismo é o esporte. Para o neoliberalismo, o jogador mais eficiente vence. Para os ordoliberais, não basta o jogador mais eficiente vencer, ele deve fazer isso em uma competição justa e aceitável moralmente”, diz Christian Joerges, professor da Hertie School of Governance, em Berlim, e especialista no tema.
Na década de 1940, o ordoliberalismo incorporou ideias de um quarto professor, o católico Alfred Müller-Armack, da Universidade de Colônia: além de garantir regras justas, o Estado deveria oferecer políticas sociais para o bem-estar da população.
Müller-Armack também sugeriu um novo nome para tornar a teoria mais atrativa ao público, e passou a chamá-la de economia social de mercado. Algo entre o liberalismo puro e a economia socialista planificada.
As ideias ordoliberais chegaram ao poder com o governo do primeiro chanceler federal da antiga Alemanha Ocidental, Konrad Adenauer, que comandou o país de 1949 a 1963, e de seu ministro da Economia e sucessor, Ludwig Erhard, que governou a nação até 1966. (Da DW)