No movimento pendular da política, quanto mais se estica a corda, com mais intensidade ela se desloca em sentido contrário. O fenômeno Bolsonaro é resultado desta prática. No auge do petismo, Lula e depois Dilma, considerando-se imbatíveis, mantinham o discurso afiado contra os opositores. O foco era um certo revanchismo contra os militares, mas especialmente a demonização da direita, dos valores conservadores e de partidos como o Democratas, “que deveria ser extirpado da política brasileira”, dizia Lula.
O resultado é conhecido. A sede hegemônica petista pariu a direita brasileira. Meio desfigurada, desarrumada e até tosca em certo sentido. Liberais, conservadores, lavajatistas e antipetistas de toda ordem se juntaram em uma frente liderada por um deputado do baixo clero que soube assumir o figurino de outsider e chegou ao Planalto embalado nesta onda.
No poder, Bolsonaro repete o erro do enredo petista. De maneira desforme e desorganizada, estica a corda do pêndulo que o levou ao poder, agora em sentido contrário. Governa alicerçado na polarização, tornando-se refém do embate constante e discurso hegemônico da direita que representa. Ao acirrar os ânimos e incitar o confronto, demonizando adversários, recai no mesmo erro do petismo, que se achava invencível.
Assim como Lula preparou o terreno para o surgimento de Bolsonaro, este faz o mesmo, estendendo um tapete vermelho para o opositor que está diametralmente oposto ao seu campo político. Este nome pode ser Guilherme Boulos. A polarização gera um efeito inverso que acaba por abrir as portas do inferno para o governo.
Poucos acreditavam em 2015 ou 2016 que Bolsonaro seria eleito presidente. Repeti à exaustão que sua vitória se desenhava. Hoje faço a mesma provocação: Quem acredita ser impensável Boulos chegar ao Planalto, precisa entender que seu principal cabo eleitoral é Bolsonaro e sua forma torpe de lidar com a política.
Diante do desgaste do PT, PC do B e especialmente Psol passaram a ocupar a liderança do voto de esquerda. Boulos sempre foi próximo de Lula e nada agradaria mais a ele do que a companhia do ex-presidente em sua chapa. Boulos teria em Lula um vice experiente, que dialoga com o mercado e a classe política. A idade e rodagem de Lula o fariam o nome ideal para encarar o desafio.
Para isso se concretizar, Boulos precisava de projeção nacional, exatamente o que esta eleição lhe entregou. Não pode correr o risco de ganhar, porque no fundo já ganhou. A chegada ao segundo turno é uma vitória que projeta seu nome e abre o caminho diante da campanha que realmente importa: a corrida pela cadeira de Bolsonaro daqui dois anos.
O poder cega e turva a mente. As armadilhas e erros da soberba podem fazer com que o movimento pendular da política se mova com força e intensidade. Depois de abater o petismo, a próxima vítima pode ser o bolsonarismo.
(Márcio Coimbra é cientista político e coordenador da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília)