A dupla abordagem da nova arquitetura fiscal contempla um primeiro pilar para realocar as receitas fiscais das multinacionais
Por Charles Machado – SC
Nesse momento o mundo acelera uma ofensiva regulatória para diminuir o poder das big techs. E e ao mesmo tempo tributar essas empresas com cargas mais justas.
Facebook, Google, Amazon, Apple ou Microsoft nos Estados Unidos; ou Baidu, Alibaba, Tencent, ByteDance ou Didi na China estão, após anos de bonança e regulação propícia, sob os holofotes de seus respectivos governos ou de outros territórios.
Começa atrasado, afinal, essas empresas realizam verdadeiro oligopólio global em alguns segmentos, vejamos como exemplo a publicidade digital, onde as empresas acima concentram mais de 95% de tudo que se investe em publicidade digital no mundo.
Com uma legislação tributária obsoleta, com a ausência de medidas universais, e países dispostos a sacrificar renda de curto prazo para atraí-las para seu território, permitiram que essas empresas crescessem com cargas tributárias em alguns países de 2% ou 3% sem cometer qualquer crime.
Essa possibilidade, que também foi aproveitada por multinacionais de outras áreas não tecnológicas, permitiu que elas competissem vantajosamente contra pequenas empresas incapazes de acessar esses incentivos fiscais, gerando um ambiente em que a inovação era cada vez mais restrita.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) está aumentando suas previsões de receita para a futura reforma tributária global e garante que a realocação das receitas fiscais das transações de grandes multinacionais permitirá um aumento anual na receita global de até US$32 bilhões.
A dupla abordagem da nova arquitetura fiscal global, gerida pelo Quadro Inclusivo da OCDE e pelo G20 para enfrentar os desafios fiscais decorrentes da digitalização da economia, contempla um primeiro pilar para realocar as receitas fiscais das multinacionais derivadas de transações eletrônicas para as jurisdições onde os bens ou serviços vendidos são consumidos.
Já um segundo pilar envolverá a implementação de um imposto mínimo global sobre as sociedades de 15%.
A nova análise argumenta que os países de baixa e média renda obterão uma parcela maior da receita existente com o imposto. Assim, a OCDE sublinha a importância de uma implementação rápida e generalizada das reformas.
O fato é que o derretimento da velha economia leva consigo os modelos tributários mundiais, que não conseguem acompanhar os novos desenhos da nova economia (compartilhada, de atenção etc), cuja forma de apurar suas receitas cria uma série de dificuldades para máquina fazendária.
As big techs, tem seu valor ampliado na medida da sua importância e mais ainda da expectativa dos novos papéis que essas empresas devem assumir na nova economia. Nesse momento, Apple, Amazon, Alphabet (dona do Google), Microsoft e Facebook valem, juntas, cerca de seis trilhões de dólares, esse valor é quatro vezes maior que o PIB brasileiro.
Desafio, concentração de negócios e impostos
Veja PIB da China e dos Estados Unidos superam a casa dos US$ 6 trilhões. E o que essas empresas produzem? O que fabricam em suas próprias fábricas que não seja terceirizado, ficando encarregada “apenas” pelo conhecimento, o valor principal, o ativo intangível.
A mudança da economia mundial, com essa concentração de negócios e de dados representa um desafio para o Direito Regulatório, evitar e estabelecer limites ao exercício dessa concentração é uma obrigação.
O Intangível é o senhor da nova economia, pois, de meados do século 20 para cá, o capitalismo passa por uma estonteante mutação. As mercadorias corpóreas ficaram em segundo plano, enquanto a fabricação industrial de signos assumiu o centro da geração de valor.
Assim o capital trabalha para o desejo, não mais para a necessidade, e as informações criam e modulam os desejos, fabricando e ajustando demandas.
Tente ver quanto a sua cidade tributa o Facebook pelos conteúdos patrocinados? Tente ver quanto o Google paga de ISS na sua cidade?
Parece claro que a tecnologia é um ambiente que dota as empresas com uma capacidade desenfreada de exercer o poder monopólio em muito menos tempo do que antes, e isso exige que os governos tenham muito mais pressa em sua regulação.
Com o privilégio de tributações favorecidas, as empresas de tecnologia entram em áreas como saúde ou exploração espacial, que antes pareciam reservadas ao poder econômico e à tomada de riscos dos governos, e olham com preocupação para os efeitos de suas ações no mercado ou na sociedade como um todo.
Segundo uma análise da Bloomberg Economics no primeiro semestre, mostrou que a alíquota média de impostos das 50 maiores empresas do mundo caiu de 35,5% em 1990 para 17,4% no ano passado. Facebook (12,2%) e Amazon (11,8%) pagaram abaixo dessa alíquota em 2020.
O esforço em se ter um tributo mundial, coloca um basta, a mais de 30 anos de redução progressiva das alíquotas pagas por grandes empresas multinacionais, à medida que os diversos países do mundo tentavam atrair seus investimentos por meio de isenções fiscais e taxas de impostos absurdamente reduzidas. São os primeiros passos para o fim de uma guerra fiscal mundial, na concordância que na nova economia as big techs precisam pagar mais do que pagam hoje.
Nos tempos atuais a maioria dos atos de governo são motivados, por aquilo que os espanhóis chamam de “curtoprazismo”, a lógica de atacar graves enfermidade pensando apenas no curto prazo, se esquecendo da verdadeira causa da febre que domina o corpo doente.