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Um imposto global sobre as big techs

Big Tech tributação oligopólio Misto Brasil

As bigs techs se tornaram um conglomerado de oligopólio que escapam dos impostos/Arquivo

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Aqui agora cabe uma necessária reflexão, visto que a economia digital produz números e uma concentração de riqueza jamais imaginada

Por Charles Machado – SC

Toda vez que se noticia algum novo tributo, ou a ampliação da sua base de contribuintes, ou aumento de alíquotas, o sentimento de rejeição quanto a nova incidência tributária é quase como um grito uníssono.

Afinal, novos tributos em um país com uma das maiores cargas tributárias do mundo, parece ser sempre um deboche ou mais um absurdo para se perpetrar nos bolsos já combalidos do contribuinte.

Ao mesmo tempo nessas horas o contribuinte calejado, puxa pela sua memória, os míseros investimentos feitos pelos três entes federativos (União, Estados e Municípios) e as descabidas remunerações – de algumas categorias de servidores -, e, claro, o caldo disso tudo sempre será a rejeição.

Dito isso, o sentimento não poderia ser outro, quando no último dia 3 de outubro, exatos 90 dias antes de 1º de janeiro de 2025, a União publicou a MP 1262.

A finalidade foi estabelecer, no Brasil, tributação mínima efetiva de 15% sobre a renda corporativa.

Foi para adaptar a legislação brasileira às Regras-Modelo Globais contra a Erosão da Base Tributária (Global Anti-Base Erosion Rules –Regras-modelo GlobE, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Aqui agora cabe uma necessária reflexão, visto que a economia digital produz números e uma concentração de riqueza jamais imaginada, o que representa poder econômico e político nas mãos de poucos.

Para termos a exata medida, as maiores empresas de tecnologia, as big techs possuem um valor de mercado bem maior do que o PIB de toda América Latina. A Microsoft, Google, Amazon, Ali Baba, Meta (dona do Facebook, do Instagram e do WhatsApp), e Apple, são avaliadas acima de US$ 10 trilhões.

É muito maior que o PIB de todos os países da América Latina juntos, em que pese essas nações terem um contingente populacional de 660 milhões de pessoas.

É claro que empresas com valor de mercado acima da economia de países não e uma novidade, mas quando poucas empresas juntas ultrapassam o valor de mercado da casa dos trilhões de dólares, em tão pouco tempo isso implica em uma economia com a percepção distinta de valor.

Esse dado, de forma isolada não serve para uma medida de tributação global mínima, mas indica o poder de concentração econômico, e o estrago que essas Big Techs podem fazer em qualquer mercado do mundo, e logo é preciso uma tributação que coloque as mesmas no mesmo patamar tributário de empresas pequenas e médias, para tentarmos equiparar o jogo.

Uma legislação brasileira para se adaptar ao mundo

É de se evidenciar, que a publicação da MP foi evidentemente, cercada de um certo otimismo, quanto ao seu potencial de arrecadação, e a sua importância se mensura no fato da Receita Federal ter regulamentado o diploma legal no mesmo dia (IN RFB 2.228/2024), até mesmo antes do início de qualquer deliberação sobre a conversão da MP 1262 em lei.

Nesse ponto, fazemos um resgate histórico, para lembrar que o projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting), iniciado em 2013, e do qual resultaram 15 ações e respectivos relatórios finais (publicados em 2015) para reestruturação do sistema tributário internacional, foi considerado insuficiente em diversos aspectos, algo natural dentro da dinâmica da economia digital.

Logo, adiantamos, que a MP nasce dentro desse arranjo mundial para tributar as Big Techs.

E dessa forma igualar as regras do jogo e dentro dessa recuperação, para o entendimento da medida provisória, e a sua razão de ser.

Recordamos que a OCDE e o G20, trabalham juntos na efetivação de soluções tributárias que impactem a todos.

Acabou por gerar o grupo de trabalho, denominado Quadro Inclusivo (Inclusive Framework), que já conta com 147 países-membros, estando o Brasil incluído, e onde os trabalhos são conduzidos por um subgrupo de 24 países denominado Grupo de Direção (Steering Group).

Resultam desse trabalho, as Regras-Modelo GloBE, e seu objetivo é garantir que grandes empresas multinacionais estejam concretamente sujeitas a um piso de tributação da renda em cada jurisdição que operem.

As Regras-Modelo GloBE são essencialmente estruturadas como Regras CFC (Controlled Foreign Corporations), inclusive potencialmente gerando tributação da renda auferida por entidades estrangeiras independentemente de efetiva distribuição.

Todo esse esforço, decorre muito do derretimento da velha economia, que leva junto os modelos tributários mundiais, que não conseguem acompanhar os novos desenhos da nova economia (compartilhada, de atenção etc), cuja forma de apurar suas receitas cria uma série de dificuldades para máquina fazendária.

A nova e a velha economia do capitalismo

Essas big techs, tem seu valor ampliado na medida da sua importância e mais ainda da expectativa dos novos papéis que essas empresas devem assumir na nova economia. E o que essas empresas produzem?

O que fabricam em suas próprias fábricas que não seja terceirizado, ficando encarregada “apenas” pelo conhecimento, o valor principal, o ativo intangível.

O intangível é o senhor da nova economia. Em meados do século 20 para cá, o capitalismo passa por uma estonteante mutação.

As mercadorias corpóreas ficaram em segundo plano, enquanto a fabricação industrial de signos assumiu o centro da geração de valor. Assim, o capital trabalha para o desejo, não mais para a necessidade, e as informações criam e modulam os desejos, fabricando e ajustando demandas.

Tente ver quanto a sua cidade tributa o Facebook pelos conteúdos patrocinados. Tente ver quanto o Google paga de ISS na sua cidade.

A situação atual, com essas empresas pagando milhões de dólares em lobby políticos de todas as cores para tentar evitar, ou pelo menos atrasar o inevitável, transforma a tarefa regulatória em um caminho cheio de obstáculos.

Com o privilégio de tributações favorecidas, as empresas de tecnologia entram em áreas como saúde ou exploração espacial, que antes pareciam reservadas ao poder econômico e à tomada de riscos dos governos, e olham com preocupação para os efeitos de suas ações no mercado ou na sociedade como um todo.

Com uma legislação tributária obsoleta, com a ausência de medidas universais, e países dispostos a sacrificar renda de curto prazo para atraí-las para seu território, permitiram que essas empresas crescessem com cargas tributárias em alguns países de 2% ou 3% sem cometer qualquer crime.

Essa possibilidade, que também foi aproveitada por multinacionais de outras áreas não tecnológicas, permitiu que elas competissem vantajosamente contra pequenas empresas incapazes de acessar esses incentivos fiscais, gerando um ambiente em que a inovação era cada vez mais restrita.

Nesse momento, tudo indica que, por fatores dos mais diversos e em tempos distintos, as administrações dos Estados Unidos, da China e da União Europeia estão finalmente de acordo.

O acordo para um tributo comum de 15% para empresas com atividade internacional que foi originalmente anunciado na cúpula do G7 em Londres em junho passado foi agora ratificado por 136 países e jurisdição que juntas representam cerca de 90% do PIB mundial, e a Medida Provisória repete esse modelo.

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