Misto Brasil

Gestão de resíduos sólidos no Distrito Federal

Cooperativas trabalham com o lixo reciclado e separado no Distrito Federal/Arquivo

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O Distrito Federal não deveria passar recibo deste vexame, mas apesar de esforços de algumas pessoas diligentes e corajosas, a gestão de resíduos está muito atrás

Por Antonio Dourado Rocha – DF

Após décadas sendo conhecida como a capital com o maior lixão das Américas, o Distrito Federal finalmente conseguiu inaugurar seu aterro sanitário em 2017 e deixou de enviar os resíduos domiciliares para o Lixão da Estrutural em 2018.

Seis anos depois, em 2024, mesmo respondendo a Ações Civis Públicas e sendo condenado nas mesmas, ainda não conseguimos encerrar o Lixão da Estrutural, que mudou de nome para Unidade de Recebimento de Entulho (URE), e nem o recuperar como determinam as sentenças judiciais nas quais o GDF e o SLU foram condenados.

O Distrito Federal, capital do país, não deveria passar recibo deste vexame, mas apesar de esforços de algumas pessoas diligentes e corajosas, a gestão de resíduos que nasceu como uma das mais modernas do Continente pois teve a primeira usina de triagem e tratamento de resíduos instalada na Asa Sul em 1963, hoje está atrás da maioria das grandes cidades brasileiras.

A usina da Asa Sul recebeu outra unidade ainda maior em 1986, no PSul, mas depois disto, só viu estas estruturas se deteriorarem e desatualizarem.

Até que em 2019, foi criada a SEPE, Secretaria de Estado de Projetos Especiais, com a função de desenvolver projetos de Parcerias Público Privadas para a estruturação de concessões de serviços públicos ou de projetos de interesse público/privado.

Um dos projetos estruturantes que a Sepe desenvolveu, com participações de SLU, Adasa, Ssema e Ibram, foi o Programa de Projetos de Gestão Integrada Sustentável de Resíduos Sólidos Urbanos do DF e Entorno.

Programa foi elaborado para ser implantado em três fases, a primeira para tratar os resíduos novos, a segunda para tratar o passivo ambiental e a terceira para expandir suas interações com o entorno.

Aterro Sanitário de Brasília
Detalhe do Aterro Sanitário de Brasília que mantido pelo governo distrital/Arquivo/SLU

A primeira fase consiste em três projetos

⦁ Ecoparques – concessão de longo prazo para a implantação de três unidades de tratamento mecânico-biológico de resíduos, concebidas para substituírem as estruturas existentes de tratamento do Psul e Asa Sul, que já estão muito antiquadas e deficientes, além da instalação de uma nova, como preconizado no PDGIRS (Plano Distrital de Gestão Integrada de Resíduos).

Tais unidades seriam responsáveis pelo recebimento de todo o resíduo que passa pelas estações de transbordo do DF e nelas seria feita a triagem de recicláveis (pelas cooperativas contratadas pelo SLU) e a separação da fração orgânica dos resíduos (FORSU), restando apenas o material que não pode ser aproveitado. Este material seria encaminhado ao aterro sanitário com uma redução de aproximadamente 50% de seu volume.

Os resíduos triados seriam comercializados como recicláveis e a FORSU seria encaminhada a biodigestores anaeróbios onde seria produzido biogás que purificado produziria biometano e CO2 verde. O Resíduo da biodigestão poderia ser utilizado como fertilizante organomineral para a agricultura do cerrado.

Este projeto foi modelado para a concessão através de acordo de cooperação técnica com a Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido).

⦁ Gestão do aterro sanitário de Brasília (ASB) – concessão de longo prazo para a operação do aterro e implantação de estrutura para utilização do gás de aterro para a produção de biometano, adequação da unidade de tratamento de chorume, recebimento de resíduos de destinação direta ao aterro e instalação de unidade de tratamento mecânico biológico para seu processamento incluindo o lodo de ETEs da CAESB), central de tratamento térmico dos rejeitos dos Ecoparques e dos produzidos internamente com a produção de 30MW de energia a ser fornecida ao GDF, além de centro de visitação e educação ambiental.

Este projeto foi modelado por meio de chamamento de Procedimento de Manifestação de interesse Privado – PMI ao qual atenderam cerca de 32 empresas e consórcios.

⦁ Implantação de instalações de triagem e tratamento de resíduos da construção civil (ATTRs) concessão de longo prazo para a construção e operação das instalações que receberão cada uma cerca de 2000t/dia de RCC, com triagem de recicláveis e processamento de produtos para uso na construção civil no DF.

Projeto teve chamamento de PMI mas está paralisado no momento, entretanto, é de fundamental importância para que seja possível o encerramento total do Lixão da Estrutural (URE) que hoje recebe 6000t/dia, aproximadamente, de RCC que não possui outra alternativa de destinação no DF.

A segunda fase do Programa é exatamente a da recuperação do lixão que se encontra no momento prejudicada devido ao seu não encerramento.

Não iremos neste artigo detalhar as demais fases para que não se torne muito longo, mas vamos apenas nos concentrar na primeira fase e nos benefícios que poderá trazer para o Distrito Federal e toda a sociedade brasileira, uma vez que poderá tornar-se modelo para o país e América Latina.

Impactos estimados apenas no projeto Ecoparques

Para o conjunto de projetos podemos listar os seguintes benefícios:
⦁ Crescimento de 250% na recuperação de recicláveis;
⦁ Melhoria nas condições socioeconômicas dos catadores;
⦁ Potencial de implantação de indústrias de reciclagem no entorno, fixando o trabalhador na região;
⦁ Tratamento de 100% dos resíduos orgânicos – Atendimento à Lei Distrital;
⦁ Redução de 85% na emissão de GEE na cadeia de resíduos;
⦁ Geração de 30 MW energia renovável a baixo custo para o GDF;
⦁ Geração de cerca de 30 milhões de m3 de biometano ou redução de consumo de 27 milhões de litros por ano de Diesel veicular;
⦁ Combustível verde para toda a frota de coleta de resíduos do DF e para 25% aproximadamente da frota de transporte público;
⦁ Produção de CO2 verde para a indústria;
⦁ Redução drástica da geração de chorume no aterro sanitário – eliminação da carga do SLU despejada no córrego Melchior;
⦁ Redução de 90% do aterramento de material;
⦁ Aumento da vida útil do aterro sanitário, problema grave no DF por falta de locais para novos aterros;
⦁ Geração de fertilizante orgânico (ciclagem de carbono e nutrientes);
⦁ Redução de consumo de combustível fóssil e emissões pelo transporte de resíduos;
⦁ Revitalização ambientalmente adequada das Unidades de PSUL, Sobradinho e Asa Sul, com melhoria das condições de trabalho das Cooperativas;
⦁ Atendimento ao PDGIRS;
⦁ Realização de gravimetrias mensais – possibilidade de ações focadas em logística reversa;
⦁ Criação de centros de visitação e capacitação da comunidade nas novas instalações;
⦁ Campanhas de educação e comunicação continuada à sociedade;
⦁ Melhoria da disposição final e tratamento de resíduos no Entorno;
⦁ Geração de emprego e renda no DF;
⦁ Geração de impostos para o DF
⦁ Redução da importação de Diesel e Fertilizantes
⦁ Recuperação do Lixão da Estrutural com a disponibilização de 204 há de terra a 15 km do Palácio do Planalto;
⦁ Produção de brita, areia, base de pavimento/calçamento e outros insumos da construção civil a baixo custo;
⦁ Projetos rentáveis para a iniciativa privada e com otimização de gastos do DF com gestão de resíduos.

Mesmo com esta gama de benefícios, os projetos estão andando a passo de tartaruga devido aos entraves burocráticos e do Tribunal de Contas.

Enquanto isto o DF segue enterrando 2800t/dia de material, a reciclagem segue em 3% e a emissão de gases de efeito estufa (leia-se mudanças climáticas) no DF segue crescendo.

(Antonio Dourado Rocha é engenheiro sênior e Ssócio fundador e diretor na G4 Energia & Meio Ambiente)

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