Francis França, editora-chefe da DW Brasil
O Brasil atravessa uma dura crise política e econômica há mais de três anos, e, para os mais otimistas, a impressão era de que as turbulências e os traumas eram efeitos colaterais esperados em uma democracia que busca combater a corrupção e a impunidade para amadurecer. Acreditava-se que o país estava afundando, mas para renascer uma versão melhor de si.
Essa ilusão acabou nesta quarta-feira (02), quando a Câmara dos Deputados barrou a denúncia por corrupção passiva contra Michel Temer, o primeiro presidente na história do país a ser alvo de denúncia criminal no exercício do cargo – flagrado mantendo conversas pouco republicanas com um magnata investigado pela operação Lava Jato.
Pois bem, o Brasil não está combatendo a impunidade. Nem há real recuperação da economia. Obviamente, também não há preocupação em reduzir a desigualdade e a injustiça social, incubadoras da violência insuportável que se espalha por todo o país e produz estatísticas semelhantes às de uma guerra civil.
A vitória do presidente foi, como ele próprio declarou, incontestável. Ela foi conquistada com uma série de manobras escandalosas e a distribuição bilionária de verbas e de cargos. E todo esse apoio já custou ao Brasil o ajuste fiscal, a proteção da Amazônia e das metas do clima, os direitos dos povos indígenas e sobrecarregou ainda mais o trabalhador comum. Excluiu os excluídos de sempre e deve causar danos de longo prazo.
Já os privilegiados de sempre continuam desinibidamente prestando favores uns aos outros. E embora a vitória de Temer passe a mensagem de um presidente forte, os deputados viram como pode ser lucrativo manter um presidente encurralado e já devem esperar ansiosos por uma nova denúncia da Procuradoria-Geral da República.
Com isso, o Brasil continua sua jornada rumo ao retrocesso. Na edição de 2017 do ranking ”The Soft Power 30”, que mede o prestígio político do país no exterior, o Brasil aparece na penúltima posição, à frente apenas da Turquia – após ter liderado os Brics alguns anos atrás.
E deve continuar nas sombras até as eleições gerais de 2018. Até porque, mesmo que o presidente fosse afastado, o problema maior continuaria nas entranhas do Legislativo, disposto a qualquer negócio.
E o brasileiro médio assiste a tudo atônito e impassível. Aflito com uma possível volta da esquerda e com a paranoica “ameaça do comunismo”, teme mais seus fantasmas do que seus algozes, e prefere ficar de braços cruzados.
A democracia brasileira terá um longo ano pela frente.