Gatos e cachorros também nos escritórios

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Texto de Renata Monteiro

Como a porta do escritório está aberta ouvem-se bem as patinhas rápidas a tropeçarem pelo corredor, ora para a frente, ora para trás, a passos ritmados — “Sport! Pt? Aqui!” —, que agora se vão aproximando do escritório de Helena Vaz. A administradora espreita por baixo da secretária e quando volta a sentar-se já tem outro sorriso: “Eles vieram dar uma vida à empresa! Isto sim é alegria no trabalho.”

Há quase dois meses que a Pt e o Sport, ainda cachorros, foram adaptados pela Matosinhos Sport e vivem nas instalações da empresa municipal de desporto daquela cidade do Porto. Também os gatos Sanjo e Oliva se acomodaram nos gabinetes das vereadoras da Câmara Municipal de São João da Madeira, em Aveiro, por finais de Outubro. Já a Boomer (cadela e mascote) vai e vem todos os dias para a Boomer (agência criativa na Maia), enquanto os cerca de 800 trabalhadores do edifício da Nestlé, em Lisboa, podem optar por levar o cão para o trabalho desde Junho último, aceitando cumprir um regulamento e certificações restritas.

Depois de alguns (poucos) centros comerciais e restaurantes portugueses permitirem a entrada a animais de companhia, o que levou estas e outras empresas a tornarem-se pet friendly? Ou a adaptarem cães e gatos que ficam nos escritórios, mesmo depois de todos os colaboradores irem para casa?

Um dos estudos recentes mais citados sobre este tema foi publicado no International Journal of Environmental Research na Public, em maio de 2017. Pesou os “benefícios e os potenciais desafios” da presença de cães no local de trabalho e concluiu que, devido à necessidade de mitigar as “longas jornadas diárias”, as “maiores exigências laborais” e “o stress elevado”, as políticas “dog friendly são muito apelativas tanto para empregadores como para empregados”. “De fato, os benefícios podem manifestar-se em taxas mais baixas de absentismo e em maior moral e produtividade”, lê-se, bem como “num maior apoio social” e “num aumento das interações” entre funcionários.

Ao jornal Guardian, em 2016, Stephen Colarelli, um dos psicólogos por trás de um outro estudo da Universidade Central de Michigan, explicava que “ter um cão no escritório faz com que as pessoas pareçam mais amigáveis e acessíveis” e que “aumente a cooperação, intimidade, confiança e outros comportamentos positivos entre grupos de trabalho”, concluiu, sem que para isso os empregadores tenham de gastar mais dinheiro. 

Mas as vantagens estão longe de ser lineares e os estudos feitos até ao momento são insuficientes para chegar a uma resposta definitiva, avisam os investigadores. A única certeza é que quando “um empregado traz o cão os efeitos no local de trabalho estendem-se para além dele”. E, por isso, “a decisão de aceitar cães ou outros animais é complexa e só deve ser tomada depois de uma reflexão cuidada”. 

Na lista de riscos é obrigatório incluir “possíveis reações alérgicas de alguns colaboradores” (embora estas “possam ser facilmente aplacadas”, salvaguardam); fobias ou desconfortos; o bem-estar do próprio animal; doenças transmissíveis entre animais não humanos e humanos; acidentes e quedas provocadas por trelas e brinquedos fora do local; possíveis comportamentos agressivos e diferentes sensibilidades culturais entre diferentes colaboradores. Mas a maior parte destas situações pode ser acautelada se forem ouvidas as dúvidas e receios dos funcionários e criadas regras desde o início.

Não só para as que têm dezenas de colaboradores, mas também para as multinacionais com várias centenas. Desde Junho último, todo o edifício da Nestlé Portugal, em Linda-a-Velha, é dog friendly, depois do sucesso de um projeto-piloto que se restringia ao 3.º piso, o da equipe da Purina. Os gatos e outros animais ficaram de fora. “Decidimos que nós iríamos focar nos cães porque eles é que realmente beneficiam da experiência”, explica Ana Silva, da equipe de marketing da empresa de comida para animais de companhia, e que, diz, é muitas vezes reconhecida apenas como sendo “a dona do Artur”.

Começou a trazê-lo há três anos, quando a presença de animais ainda só era permitida durante uma semana do ano. Agora, acompanha-a quase todos os dias. “Exatamente porque registamos imensos benefícios: redução de stress, maior colaboração entre colegas, principalmente entre diferentes departamentos, melhor comunicação (não só por email), espírito de equipe mais cúmplice, melhor equilíbrio com a vida pessoal, um ambiente mais descontraído e feliz. Mais, nas raras alturas em que não temos aqui nenhum cão, os dias nem parecem os mesmos.”

O processo é, no entanto, “muito formal”, não sendo “aceite qualquer cão”. E apesar do interesse das 800 pessoas que ali trabalham, para já só estão certificados 31 cães (a adesão tem vindo a aumentar, no entanto).

Os tutores têm de apresentar o plano de vacinação completo, o seguro de responsabilidade civil e outros documentos obrigatórios por lei: prova de chip e registo na junta de freguesia da área de residência. Já os animais “são avaliados por um médico veterinário e por um parceiro externo especialista em comportamento”, que determina se os cães “são sociáveis e se vão ser felizes em ambiente de escritório”. A empresa oferece a cada um deles um “kit de boas-vindas”: cama, comedouro, biscoitos e snacks, resguardos e brinquedos que ocupem o animal e não façam barulho, enumera. 

(Renata Monteiro é repórter do Público)

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