Se você anda sempre perdendo a carteira, certifique-se que se tem dinheiro lá dentro – é provável que ela seja devolvida. Esta é a conclusão de um estudo sobre honestidade cívica publicado na revista Science, que estudou o comportamento das pessoas, em 40 países, quando encontram uma carteira perdida.
Os quatro investigadores que conduziram o estudo contrataram 13 estudantes suíços, que “perderam” 17 mil carteiras em 355 cidades. Com exceção de dois países, a percentagem de devolução das carteiras foi sempre maior quando estas tinham dinheiro. E, quanto maior a quantia, maior a taxa de devolução.
Um resultado que surpreendeu os investigadores. “Esperávamos uma taxa de retorno inferior quando as carteiras tinham dinheiro”, sublinhou o economista comportamental Alain Cohn, da Universidade de Michigan, um dos quatro nomes que assina o estudo, citado pelo The Guardian.
O modus operandi dos estudantes contratados era sempre o mesmo. As carteiras eram transparentes, deixando ver o dinheiro sem que fosse necessário abri-las. E tinham sempre uma lista de produtos de mercearia, escrito na língua local, uma chave, três cartões em que era possível identificar o proprietário e um endereço de email. Algumas carteiras não tinham dinheiro, outras tinham cerca de 13 dólares (cerca de R$ 50) em moeda local. Os estudantes deixavam as carteiras em locais públicos, hotéis, bancos, museus, com uma nota a dizer “encontrei esta carteira, alguém a deve ter perdido. Estou com muita pressa. Pode tratar disto?”.
Os investigadores calcularam então a taxa de retorno, com base no número de pessoas que contataram o suposto proprietário através do email que estava na carteira nos 100 dias seguintes. Em média, 40% das carteiras sem dinheiro foram ‘devolvidas’ (ou seja, foi estabelecido o contato, dado que os investigadores diziam depois às pessoas para ficarem com o dinheiro ou dá-lo para caridade), uma percentagem que aumenta para os 51% no caso das carteiras que tinham dinheiro. O México e o Peru foram os únicos países em que a taxa de devolução foi inferior quando havia uma verba envolvida.
Os investigadores fizeram ainda uma pesquisa adicional, envolvendo três países – Estados Unidos, Inglaterra e Polónia – subindo a quantia nas carteiras perdidas para os 94 dólares (cerca de R$ 358). A taxa média de devolução aumentou para os 72%. Para perceber se as pessoas devolviam o achado por altruísmo, foram também distribuídas carteiras com dinheiro e uma chave, e outras com dinheiro, mas sem chave. Uma percentagem de 61% das primeiras foi devolvida. Quando não havia chave, o número caiu para os 52%.
À procura das motivações para este comportamento, os investigadores fizeram então um inquérito a cerca de 2500 pessoas, questionando se se sentiriam a roubar se não devolvessem as carteiras ao proprietário. A resposta afirmativa foi maioritária nas situações em que havia dinheiro envolvido, baixando nos casos em que não havia qualquer quantia monetária. A existência ou não da chave não fez variar as respostas.
Conclusão de Alain Cohn: as pessoas devolvem as carteiras não por estarem preocupadas com o proprietário, mas para não se sentirem a roubar.
Também citada pelo The Guardian, Nina Mazar, uma cientista do comportamento da Universidade de Boston (que não participou no estudo) afirma que esta investigação vem mostrar que as pessoas se esforçam por manter a imagem que têm de si próprias. É isso que explica, por exemplo, que assinar um documento de compromisso antes de alugar um carro reduza o nível de incumprimento. (Do DN)