Texto de Marcelo Rech
Na quinta-feira (02) realizou-se virtualmente, a 56ª Cúpula Presidencial do Mercosul. Foi a primeira vez que os presidentes da Argentina e Brasil se viram. E o que deveria ser uma oportunidade para o entendimento, tornou-se mais um exemplo da presunção argentina.
Dois dias antes do evento, Alberto Fernández provocou um enorme mal estar na região ao afirmar que, na América Latina, apenas ele e o mexicano Andrés Manuel López Obrador, tinham disposição em mudar o mundo. Também reclamou por não ter mais a compania de Nestor Kirchner, Evo Morales, Rafael Correa, Tabaré Vázquez, Hugo Chávez, Lula e Fernando Lugo.
Em seu discurso no MercosulL, saudou o paraguaio Mario Abdo Benítez como “Marito” e ao colega uruguaio Luis Lacalle Pou, como “querido amigo”. Também fez questão de referir-se ao “amigo” Josep Borrell, chefe da diplomacia europeia e ex-ministro de Assuntos Exteriores do governo socialista espanhol. E, em um gesto presunçoso e mal educado, ignorou completamente o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro.
Alberto Fernández, que serviu aos governos de Carlos Menen, Eduardo Duhalde, Nestor e Cristina Kirchner, falou em unidade do Mercosur e deu-se o direito de enviar indiretas ao líder brasileiro, esquecendo-se do papel que joga o Brasil na recuperação econômica da Argentina.
Apesar das diferenças e das tensões, principalmente à época da campanha eleitoral, o governo brasileiro entendeu que as relações com a Argentina são estratégicas. Em dezembro de 2019, o Brasil concedeu, em menos de 24 horas, o agremánt ao ex-vice-presidente argentino, Daniel Scioli, para ocupar o cargo de embaixador em Brasília, sem qualquer questionamento.
Em fevereiro, Fernández enviou a Brasília, o chanceler Felipe Solá, para pedir o apoio brasileiro à renegociação da dívida argentina com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Na oportunidade, o ministro foi levado a conversar com o presidente e Jair Bolsonaro que expressou o apoio esperado pela Casa Rosada.
Além disso, partiu do presidente brasileiro a sugestão de ver-se com Fernández na cerimônia de posse do presidente uruguaio, Lacalle Pou, em 1º de março. Apesar da distância de 1h de voo entre Buenos Aires e Montevideo, Fernández não apareceu e preferiu, logrado o apoio brasileiro, voltar-se contra Bolsonaro.
Esses episódios somados ao desejo argentino de não participar das negociações comerciais no âmbito do Mercosul – medida que depois foi cancelada – fizeram aumentar o isolamento de Fernández junto ao Brasil, Uruguai e Paraguai.
Bolsonaro, em sua fala no Mercosul, adotou uma postura muito mais diplomática. Saudou à todos e fez uma defesa forte do bloco e de sua vocação para o comércio, elemento considerado fundamental na recuperação econômica pós-pandemia.
“Continuemos todos a defender, de maneira incansável, o compromisso do Mercosul com a democracia, um dos pilares do nosso bloco e da nossa região”, afirmou o presidente, reiterando o que tem dito interna e externamente.
Ainda nesta linha, Bolsonaro apelou a todos os presidentes para que, “como eu mesmo fiz, instruam seus negociadores a fechar os textos (dos acordos de livre comércio com a União Europeia e EFTA)”. A Argentina é contra.
Em relação aos temas explorados, principalmente na Europa, mandou um recado claro: “nosso Governo dará prosseguimento ao diálogo com diferentes interlocutores para desfazer opiniões distorcidas sobre o Brasil e expor as ações que temos tomado em favor da proteção da Floresta Amazônica e do bem-estar das populações indígenas”, afirmou.
Alberto Fernández que tanto condena a aliança com os Estados Unidos, mesmo pedindo socorro a Donald Trump, mostrou-se, também, muito mais um porta-voz do Grupo de Puebla, que preside, que um líder argentino. A ambiguidade não passou desapercebida.
“Guardo por todos os líderes o respeito que merecem, mas não penso igual a muitos. Sei que minha passagem pela história argentina é uma passagem e não tenho o direito de frustrar a aspiração continental que temos de nos unir e crescer juntos simplesmente porque não penso igual”, disse, invocando, mais uma vez, os conceitos bolivarianos que o inspiram.
O Mercosul, agora sob o comando do Uruguai, pretende impulsionar uma agenda desideologizada com o apoiod de Brasil e Paraguai. Lacalle Pou também defende os acordos de livre comércio e rejeita a ideia de que o bloco tenha de optar entre Estados Unidos e China. Em 2021, o bloco celebrará seus 30 anos de fundação sob as presidências de Argentina e Brasil.