As eleições na Bolívia e o redesenho político-ideológico regional

Luis Arce Catacora e seu vice David Choquehuanca
Presidente eleito da Bolívia Luis Arce Catacora e seu vice David Choquehuanca/La Prensa
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Texto de Marcelo Rechl

No domingo (18), tivemos, após quatro adiamentos, as eleições presidenciais na Bolívia, cujos resultados ainda não oficiais indicam uma vitória esmagadora do partido de esquerda MAS, liderado pelo ex-presidente Evo Morales. Ainda é cedo para cravar o que o economista Luis Arce pretende fazer, inclusive com o ex-presidente que se encontra asilado na Argentina. O fato é que a recondução da esquerda ao poder na Bolívia, pode marcar um redesenho político-ideológico regional.

No passado, o eixo Caracas – La Paz – Buenos Aires, foi determinante para que mecanismos regionais como a Unasul e o Mercosul, fossem contaminados ideologicamente. Ambos serviram de plataforma para a criação da Celac, pensada à medida para acomodar uma Cuba inflexível quanto ao seu retorno ao sistema interamericano através da OEA.

Esses três instrumentos, provocaram danos graves ao processo de integração, principalmente física, da região. Todas as energias foram direcionadas a um projeto político-ideológico de domínio da esquerda na América Latina. Atores extrarregionais como Rússia, Irã e China, perceberam os novos ventos e firmaram presença em toda a região apoiando este projeto.

Para tanto, contaram, ainda, com o descaso e a indiferença dos EUA, que sempre mirou a América Latina como um quintal problemático e indesejado. As políticas norte-americanas para a região são marcadamente ingerencistas e guardam relação direta com seus interesses, que não são os mesmos dos latino-americanos.

Este cenário facilitou as coisas para o Foro de São Paulo, mecanismo catalisador das forças de esquerda, incluindo grupos à margem da lei, que chegaram a governar quase toda a América do Sul e parte importante da América Central.

Lamentavelmente, o giro à esquerda não se revelou transformador. Continuamos como a região mais desigual do planeta. Houve uma importante recuperação econômica, mas os resultados foram tímidos se comparados com o crescimento e fortalecimento da corrupção institucionalizada. O fracasso da esquerda, permitiu que novos governos de centro e de direita, retornassem ao poder. No entanto, a corrupção endêmica nunca foi extirpada. Também não houve esforço por modernização das administrações e seguimos patinando economicamente.

A Bolívia é um dos principais produtores de cocaína do planeta. É um país estratégico também. Geograficamente, encontra-se no coração da América do Sul. Possui reservas significativas de petróleo, gás, lítio e sal. Além disso, conta com variados depósitos de minerais metálicos, como estanho, prata, cobre, antimônio, zinco, ouro e enxofre. Essas são algumas das características que fazem com que a Bolívia não passe desapercebida internacionalmente e tornam o resultado de uma eleição presidencial, tema obrigatório de acompanhamento.

A Bolívia também é o país com o qual o Brasil compartilha a sua fronteira terrestre mais extensa, de 3.423 km (maior que a fronteira entre EUA e México, de 3.141 km).  É, ainda, o único país da América do Sul que tem zona limítrofe com quatro Estados brasileiros (Acre, Rondônia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul).

O governo brasileiro, o ministério das Relações Exteriores e as Forças Armadas, sabem que a relação bilateral não pode ser negligenciada, em particular do ponto de vista das integrações energética e de infraestrutura física, além da necessária coordenação para o combate a ilícitos transnacionais. A Bolívia depende, também, do Brasil, para integrar o Mercosul como membro pleno. Somos o único país que não ratificou o Protocolo de Adesão do país ao bloco.

A tendência é que o Brasil aguarde os primeiros anúncios do presidente eleito para decidir como atuar. A esperança é que Luis Arce repita Lenín Moreno, do Equador, que, eleito, distanciou-se de Rafael Correa. O papel de Evo Morales no futuro governo ditará o rumo que a Bolívia tomará na região e se o eixo bolivariano será reconstruído.

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