A política externa e o estresse presidencial

Presidente Jair Bolsonaro Misto Brasília
Bolsonaro é alvo de uma nova investigação na Polícia Federall/Arquivo/Divulgação/PR
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Texto de Marcelo Rech

Na quarta-feira (11), o presidente Jair Bolsonaro tornou público o seu estresse ao sugerir uma guerra com os Estados Unidos, chamar os brasileiros de “maricas” e afirmar que sua vida pessoal é uma desgraça. O ato público que concentrou toda essa raiva, pretendia servir de retomada do turismo após os meses de distanciamento social, mas ninguém se deu conta disso. Nem mesmo o próprio presidente.

Bolsonaro, no entanto, percebeu o tamanho da mancada enquanto falava, mas aí já era tarde. Suas palavras correram o mundo como fogo em um rastilho de pólvora. O presidente desagradou todo mundo, embora ainda conte com a contemporização de muitos. Os militares, por exemplo, preferiram não dar corda.

O que se percebe, na verdade, é um presidente cansado, estressado e com dificuldades de lidar com as pressões naturais que a liturgia do cargo impõe. É preciso ter foco e planejamento, além de muita paciência. Não é o que se percebe.

Os estragos poderiam ser maiores e, no futuro, é possível que sejam. O presidente ainda não entendeu que, até mesmo o seu silêncio impacta  absolutamente tudo. Quanto mais as suas palavras. Nada passa desapercebido. Especialmente em um ambiente polarizado, então, cada gesto é analisado com lupa, aqui e no exterior.

O fato de Bolsonaro não ter saudado o provável presidente norte-americano quando quase todo mundo já o fez, pode ser um problema, mas é defensável, afinal de contas, o resultado das eleições não foi anunciado oficialmente. No entanto, a forma como reage o presidente gera preocupações. Em muitos casos, sugere algum nível de desequilíbrio.

É óbvio que em Washington, ninguém perdeu um único segundo de sono por conta das palavras do presidente brasileiro. Ainda assim, o chefe de Estado deve respeitar determinados protocolos, mesmo quando outros não o fazem, não importa. Jair Bolsonaro poderia, sim, criticar o candidato democrata que pôs preço na preservação da Amazônia. A defesa da soberania é prerrogativa do presidente da República.

Mas, não se pode reagir com base em ruídos e especulações. Em um contexto eleitoral, Joe Biden falou o que deveria falar, para o seu público. Passadas as eleições, o papo será outro. Os Estados Unidos não admitem perder o Brasil como aliado em uma região marcadas por problemas políticos e extremismos. Temos 17 mil km de fronteiras com dez países, nove tríplices fronteiras e problemas comuns como narcotráfico e crime organizado. Chance zero para o isolamento do Brasil como propagado pelos inimigos de Bolsonaro.

Agora, a forma, seguramente muda. Joe Biden lidará com os desafios internacionais, com diplomacia e diálogo, diferente de Donald Trump, que privilegiou a truculência e a grosseria. Seguramente, haverá muito mais esforços por parte dos Estados Unidos no sentido de fortalecer o sistema multilateral, o que é positivo, principalmente para os países pequenos e aqueles em desenvolvimento, como o Brasil.

E ninguém poderá reclamar das preferências de Bolsonaro por Trump. Gosto e simpatias, não se discutem. Por outro lado, suas preferências não podem contaminar uma relação histórica e necessária. Nos dois sentidos, diga-se. Ignorar o óbvio apenas por inclinação ideológica é um grande erro.

Nutrir simpatia e amizade por alguém, é absolutamente legítimo. Só não vale misturar as coisas. Brasil e Estados Unidos são maiores que seus presidentes, atuais, passados e futuros. Além disso, é preciso medir as palavras para evitar ridicularizar, por exemplo, as Forças Armadas e outras instituições que sim, são fundamentais para a democracia.

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