Texto de André César
O dia 17 de janeiro último foi histórico. Tão logo a Anvisa liberou o uso emergencial de duas vacinas (Coronavac e de Oxford), o governo paulista iniciou a vacinação da população. Mais ainda, começaram a ser distribuídas doses para todo o país. Estaria resolvido o problema do coronavírus?
Infelizmente, a resposta é “não “. A razão é simples – faltam vacinas e o governo federal bate cabeça enquanto busca soluções para a questão. O quadro é preocupante.
O caso envolvendo a Índia sintetiza o imbróglio. Bolsonaro tentou enviar um avião brasileiro para trazer daquele país dois milhões de doses, que seriam aplicadas na população. Os indianos, porém, vetaram os planos do Planalto e não forneceram as vacinas. Pior, começaram a exportar as mesmas vacinas para outros países (muitos deles vizinhos, diga-se, em uma clara tentativa de contenção da doença em suas fronteiras), e o Brasil não aparece na lista de compradores.
Além disso, a China está impondo obstáculos para repassar ao Brasil insumos necessários para a produção de vacinas. Esses entraves já começaram a atrasar a produção em larga escala em nosso país.
Nos dois casos (Índia e China), boa parte da responsabilidade da situação atual recai sobre a política externa brasileira. Ao alinhar-se ao governo Trump, Bolsonaro afastou-se dos chineses, importantíssimos parceiros comerciais do Brasil. Pior, uma série de intrigas geradas a partir do chamado “núcleo ideológico” do governo abalaram severamente as relações com Pequim. A conta chegou, e é salgada.
Quanto à Índia, há um fato específico – recentemente, o Brasil se negou a apoiar aquele país, que havia solicitado à OMC a quebra temporária de patentes para a produção de medicamentos para o combate à pandemia. Nova Delhi está se vingando.
Enfim, o estrago está feito. Ao governo, resta reconstruir as pontes queimadas ao longo desses últimos anos. Para começar a reverter o quadro, seria importante um mea culpa por parte do Planalto e do Itamaraty. Resta saber se a palavra “humildade” integra o léxico de Bolsonaro.