A sociedade da desatenção pode destruir a Terra?

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Representantes maiores da economia da desatenção, as redes criam a ditadura da estética

Por Charles Machado – SC

Na praia, no restaurante, no almoço de casa, experimente olhar ao seu redor, a cena sempre se repete, um dedicado e fixo olhar para tela do celular, esse sumidouro das nossas horas, das nossas relações, das nossas vidas, na lógica da “a desatenção, gerada pela disputa da atenção.”

Os celulares, suas telas e os algoritmos, ditando nossas escolhas assumiram o protagonismo das nossas vidas, onde nossas escolhas fazem parte sempre de uma métrica comercial na busca de monetização através da nossa atenção e dos nossos dados. É um casamento que produz mais e melhores resultados financeiros.

Dados que geram mais tempo de atenção “desatenção” que engolem a nossa dedicação e ampliam o fosso relacional, que dita o tom da produção, e do consumo na economia da desatenção.

A busca pela nossa atenção, não está apenas nos celulares. Afinal, nem tudo se resume a celulares, mas considere que quando esses aparelhos e seus aplicativos tomam nossa tempo e nosso dinheiro, a produção de tudo mais continua lutando para sobreviver e encontrar um espaço no seu bolso.

E logo o primeiro reflexo é ampliar o grau de obsoletismo de tudo que compramos, isso mesmo nossos eletrônicos e tudo que consumimos vem datado. Na lógica de sustentação da economia da desatenção, a disputa é pelo seu bolso, ainda que o caminho sejam seus dados e seu tempo.

Assim, se caminham nas ruas, sem ver o tempo voar, sem olhar o mar ou o companheiro ao lado, os filhos, a esposa, tudo parece perder sentido e necessidade diante de um apurado design de tela onde o mundo de carne e osso parece ser tão distante. O sorriso fácil para magnânima tela parece  ser uma catarse.

Representantes maiores da economia da desatenção, as redes criam a ditadura da estética e logo nos comparamos com os outros e, sofremos. Estética que vai do novo penteado ao novo celular.

Nossos investimentos caminham para ficarmos a cada dia – quem sabe um pouco mais Gretchen ou Eduardo Costa -, na busca da nossa harmonização facial, ou seria harmonização social na busca de mais e mais atenção?

As redes dentro da sua lógica de atenção, dão vazão a tudo que possa ser multiplicado, gerando mais compartilhamentos, curtidas e comentários e assim toda tristeza e mágoa, que é despejada nela, se multiplica. Todo delírio ganha adesões e é por isso que as fake news se multiplicam, bem como novos produtos, e nunca falta um novo e “utilíssimo” bem pra chamar de seu.

Agora tente imaginar o que acontece com os recursos naturais do Planeta, quando aceleramos o nosso consumo na busca de mais e melhores eletrônicos?

Nessa lógica, o crescimento das vendas globais de eletroeletrônicos, com o aumento dos itens por domicílio ou negócio e a substituição mais frequente dos produtos, acarreta mais demanda de energia para a fabricação e para o uso de dispositivos. Isso resulta em ampliação das emissões industriais.

E qual o impacto dessa lógica da economia da desatenção, quando se traduz na elevação de novos eletrônicos? Apenas como referência: a pegada hídrica de um smartphone, representa cerca de 1.000 litros, ou de um microchip de 2 gramas exigindo 32 litros.

Como assim? Bem, a maior fatia desse total se concentra na mineração, “provavelmente o segundo maior usuário industrial de água”, depois da geração de energia, que consume de 7 a 9 bilhões de metros cúbicos de água por ano.

Os impactos ambientais e sociais incluem superexploração de minérios e efluentes tóxicos de rejeitos, que contaminam rios e lagos. A mineração está competindo cada vez mais com as comunidades locais e com os agricultores pelo acesso aos mananciais.

Os eletroeletrônicos, atualmente, seguem modelos de economia linear. Estima-se que a produção de lixo eletrônico, em 2022, foi de cerca de 60 milhões de toneladas de resíduos eletrônicos no mundo, média de 7,8kg de lixo eletrônico por habitante.

O país que mais gera resíduos eletrônicos no mundo é a China, com mais de 10 milhões de toneladas por ano. O Brasil é o país que mais gera resíduos na América Latina.

Os fatores indutores incluem desenvolvimentos e avanços da tecnologia, obsolescência planejada e “preferências do consumidor”, sob influência provável do marketing, na lógica da desatenção.

Consumo eletrônico e o seu lixo resultante

Apesar da demanda crescente e da oferta limitada de metais, grande parte do lixo eletrônico não é reciclada.

Como referência, maior parque de reciclagem municipal da China é capaz de recuperar 1 milhão de toneladas de cobre por ano, o que é uma parcela insignificante perto do que a China produz e consome.

Pense apenas no estoque desses metais espalhados por nossas casas e ambientes de trabalhos, escondidos em dispensas e em gavetas nos eletrônicos que já não usamos mais?

A lógica de comprar novos eletrônicos, só deve ser acentuada com a transformação digital que toma nossas casas e nossos ambientes de trabalho, logo tente imaginar o lixo gerado, e os recursos naturais consumidos nesse processo, na disputa pela sua atenção.

Vamos utilizar o Reino Unido como referência, lugar onde a lei que regula a logística reversa já existe desde 2006. Lá, na terra que já foi da rainha, as vendas anuais de varejo são de aproximadamente 180 milhões de produtos eletroeletrônicos. Somam cerca de 1,4 milhão de toneladas de material e acarretam quantidade semelhante de descarte por ano. Qual o destino de todo esse material, tanto lá como aqui?

No Reino Unido, após quase 20 anos da publicação da lei, cerca de 38% do lixo eletrônico vão para aterros sanitários, onde 55% reciclados por ano. Apenas 7% são reutilizados, ainda que boa parte ainda estar funcionando ou ser reparável. Os equipamentos de computação e TI podem ser descartados em aterros sanitários; reciclados para a recuperação de materiais valiosos, como ouro e alguns plásticos; ou revendidos/doados como aparelhos ativos.

Pense na sua rotina quantas vezes você jogou fora um velho eletroeletrônico, cujo conserto seria quase o preço de se comprar um novo aparelho? Quem está ganhando com essa lógica?

O estudo, citado acima, aponta um desperdício de US$ 1,7 bilhão ao ano, apenas no Brasil, além dos danos ao meio ambiente. O Brasil é o quinto maior produtor mundial de lixo eletrônico e deve descartar mais de 2,5 milhões de toneladas este ano.

Por quanto tempo precisa prevalecer a lógica do consumo desenfreado na busca de mais atenção, na busca da realização efêmera de novos e mais bens materiais?

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