A regulamentação das apostas eletrônicas e os seus riscos à saúde

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Os jogos eletrônicos passam para um novo patamar no Brasil/Arquivo/Divulgação

O pouco ou quase nenhum cuidado com o apostador. Com as plataformas digitais, as apostas entram em uma nova área

Por Charles Machado – SC

A recente regulamentação de algumas novas modalidades de apostas no Brasil, com a publicação da Lei 14.790 no último dia 30 de dezembro, tem uma gigantesca possibilidade de repetir os mesmos erros da antiga regulamentação dos bingos.

Claro que no momento em que a União concentra a regulamentação, ela deixa de incorrer no erro dos antigos bingos onde se configurava um verdadeiro carnaval regulatório.

Para se ter uma ideia dos números que devem envolver essas novas apostas, que já ocorriam através de sites internacionais sem que o Brasil visse a cor de qualquer dinheiro, já passam de 134 empresas que estão interessadas em se regulamentar.

Mas qual o perigo dessa nova Lei? O pouco ou quase nenhum cuidado com o apostador, e a possibilidade dele desenvolver o vício, ou já nos esquecemos que na época dos bingos tínhamos máquinas instalas em padarias e jogadores compulsivos usavam o dinheiro do pão em apostas.

Após a promulgação da lei, o Ministério da Fazenda prepara 12 portarias para viabilizar esse mercado que tem um potencial de arrecadação tributária de cerca de R$ 12 bilhões anuais, claro que isso depende do estágio de maturidade do mercado.

Apenas para obter a licença cada uma das 134 empresas interessadas em atuar no país terá de pagar R$ 30 milhões para operar durante um determinado período.

Lembrando que ao longo do projeto, foram também incluídos os cassinos online o que deve fazer com que a arrecadação aumente, uma vez que nesse mercado o jogo (cassino) online representa de 65% a 70% do faturamento das empresas.

As empresas serão taxadas em 12% sobre a receita bruta dos jogos, subtraídos os prêmios pagos aos apostadores, o chamado GGR (gross gaming revenue, na sigla em inglês).

Os apostadores terão de recolher 15% sobre ganhos superiores a R$ 2.112, mas esse recolhimento será feito de forma anualizada, e não prêmio a prêmio – como previa o texto original.

O Brasil, segundo projeções, será o terceiro maior do mundo, atrás apenas dos EUA e do Reino Unido, será monitorado e fiscalizado por uma nova secretaria de Apostas e Loterias, que ficará no âmbito da Fazenda.

Em que pese a aposta não ser nenhuma novidade para o brasileiro, novas modalidades disponíveis e acessíveis a qualquer um do seu celular e outro meio digital, requer novos cuidados.

Afinal com a constituição de plataformas digitais as apostas entram em uma nova área onde o desenvolvimento do vício, a compulsividade são bem maiores, e para os quais ainda não estamos preparado?

Essa é a maior característica de novos mercados digitais, ao mesmo tempo que oferta um gigante espaço para novos negócios, exige o enfrentamento de novas questões.

Combate ao vício e prevenir o jogador

Vejamos de que forma o texto legal prevê no capítulo que trata dos apostadores.

Antes de tratarmos da Lei, que é o que se tem no momento, pois as portarias ainda não foram publicadas, já conhecemos do teor de algumas destas 12.

Uma delas, realizada conjuntamente com o Ministério da Saúde, deve prever medidas para combater o vício no jogo, mas como prevenir que o jogador não se torne um viciado?

Do que adianta atender e tratar o viciado, visto destruição familiar já se configurou antes, até o momento em que a família reconheceu o vício? E os solitários sem família?

Há também uma portaria em parceria com o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar). Onde já se sabe que as peças publicitárias não deverão usar os termos: ‘Use o jogo como forma de enriquecer’, o que convenhamos não faz sentido, afinal apostadores procuram no jogo um atalho para o enriquecimento.

As empresas que vão atuar no novo mercado também ficarão obrigadas a adotar práticas de atendimento aos jogadores, combate à lavagem de dinheiro, incentivo ao jogo responsável e prevenção de fraudes e manipulação de apostas.

O projeto aprovado pelo Congresso proíbe o jogo para menores de 18 anos; pessoas diagnosticadas com distúrbios de jogo; pessoas com influência sobre os eventos esportivos ou sobre a plataforma de jogos; dirigentes esportivos, técnicos, árbitros, agentes e atletas.

Também autoriza a suspensão dos pagamentos de apostas investigadas por manipulação dos resultados e exige que as empresas verifiquem a identidade dos apostadores com uso de tecnologia de reconhecimento facial.

Do total do GGR (receita bruta das companhias que vão atuar no mercado subtraídos os prêmios), 88% será destinado ao custeio e ao lucro das empresas e 12% irá para os cofres públicos.

De acordo com a lei quem estaria impedido de apostar, além das citadas acima:

A) O proprietário, administrador, diretor, pessoa com influência significativa, gerente ou funcionário do agente operador;

B) O agente público com atribuições diretamente relacionadas à regulação, ao controle e à fiscalização da atividade no âmbito do ente federativo em cujo quadro de pessoal exerça suas competências;

C) A pessoa que tenha ou possa ter acesso aos sistemas informatizados de loteria de apostas de quota fixa;

D) A pessoa que tenha ou possa ter qualquer influência no resultado de evento real de temática esportiva objeto de loteria de apostas de quota fixa, incluídos:
1) A pessoa que exerça cargo de dirigente desportivo, técnico desportivo, treinador e integrante de comissão técnica;

2) O árbitro de modalidade desportiva, assistente de árbitro de modalidade desportiva, ou equivalente, empresário desportivo, agente ou procurador de atletas e de técnicos, técnico ou membro de comissão técnica;

3) O membro de órgão de administração ou de fiscalização de entidade de administração de organizadora de competição ou de prova desportiva;

4) O atleta participante de competições organizadas pelas entidades integrantes do Sistema Nacional do Esporte;

5) A pessoa diagnosticada com ludopatia, por laudo de profissional de saúde mental habilitado, e nesse caso como as empresas de aposta irão ficar sabendo? Teremos um banco de dados, logo esses dados que são dados sensíveis?

6) Demais pessoas previstas na regulamentação do Ministério da Fazenda, ou seja a restrição deve ser ampliada pelas portarias.

O texto ainda destaca que as vedações previstas nas letras A, C e D são também estendidas aos cônjuges, aos companheiros e aos parentes em linha reta e colateral, até o segundo grau, inclusive, das pessoas impedidas de participar, direta ou indiretamente, na condição de apostador. Esse certamente será o ponto mais difícil de controlar devido aos inúmeros laços familiares e as suas mutações.

Claro que ao contrário do Bingo, temos um documento robusto, mas que vai implicar enormes desafios para o exercício do seu controle.

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