Bets, os jogos de azar e o azar dos jogos

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Na esteira da onda das bets, há também muito golpe na praça/Arquivo/Reprodução
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Estima-se que apenas em 2023, algo entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões deixaram de ser gastos com bens e serviços por conta dos jogos online

Por Charles Machado – SC

Nesse momento, o Brasil já é o terceiro maior mercado, para modalidade jogos de azar, conhecida como bets, se considerarmos o tamanho da nossa população no mundo, comparada a outros países onde essas formas de aposta já estão regulamentada.

E, e se considerarmos ainda que a lei que trata da matéria, que ainda se encontra em fase de regulamentação, pode-se ter uma ideia do que pode vir por ai, com problemas que vão desde o vício dos apostadores até a utilização do dinheiro que deveria servir para o alimento das famílias e o seu desvio para as casas de apostas.

Em 2023, quando ainda não estavam legalizadas, e hospedavam seus sites de apostas fora do Brasil, cerca de 300 empresas do segmento movimentaram entre R$ 60 bilhões e R$ 100 bilhões, algo impressionante, pois se trata de cerca de 1% do nosso PIB, números projetados pela Strategy & Brasil, consultoria da PwC.

Tamanha movimentação, só ocorre com a transferência da renda, visto que o dinheiro utilizado em apostas diminui a renda disponível para consumo e pagamento de dívidas.
Com a Lei publicada desde 2018, a regulamentação se arrastou até que o aperto de caixa, fez o governo se movimentar.

Estima-se que apenas em 2023, algo entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões deixaram de ser gastos com bens e serviços (ou investidos em alguma aplicação), além de ter levado uma parcela considerável desses apostadores a contraírem dívidas.

Para 2024 o faturamento com jogos deve alcançar a cifra de R$130 bilhões, o que é espantoso, quando comparado com 2020, quando antes mesmo da regulamentação das casas de apostas, o País já contava com 51 marcas, com movimentação de R$ 10 bilhões. Todos sites hospedados fora do Brasil que exigia apenas um cartão de crédito internacional, para ser possível apostar.

Por mais de uma década o Brasil viu prosperar os bingos e máquinas de jogos, em uma regulamentação confusa, e com três entes federativos legislando sobre a matéria. Tanta confusão regulatória na época levava ao absurdo de vermos então máquinas caça-níqueis instaladas em padarias, em frente a escolas, e sem qualquer controle de quem jogava.

Em bom tempo, os bingos foram fechados, bem como o uso dessas maquinas de jogos. Porém a necessidade de caixa, aliada ao fato de não ser possível virar as costas a realidade mundial das bets, fizeram com que elas fossem regulamentadas por nova lei em 2018, e ficassem congeladas até esse ano, voltando com força total.

O que difere o vício de duas décadas atrás em bingos e similares dos bets atuais?

Se os bingos tinham nos idosos o seu público preferido, o mesmo não acontece com os bets, que tem presença significativa entre os jovens, e onde reside a causa dessa e de outras mudanças, nesse novo e pernicioso hábito?

Se antes os apostadores entravam discretamente nos bingos, e esses por sua vez mantinham cafés e outras guloseimas para segurar o público nas suas casas de aposta, o mesmo não ocorre com as bets. Elas estão literalmente na palma da mão dos apostadores. E pior, as apostas podem ser feitas 24 horas por dia nos sete dias da semana, de qualquer lugar do planeta.

Sem a necessidade de se deslocar até um bingo, ou máquina de jogos, os novos apostadores estão apostando de qualquer lugar e hora, seja no trabalho, na escola, em casa ou no trajeto dos seus deslocamentos.

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Muitos jovens já estão viciados nos jogos online que aceitam apostas sete dias por semana/Arquivo/Matheus H. Souza/ Agência Brasília

As bets e suas polpudas verbas publicitárias estão presentes diariamente em milhares de conteúdos pagos, produzidos por suas assessorias, com matérias sobre esportes entre outros assuntos, como ferramenta para fisgar seus apostadores. Tudo na disputa da atenção do usuário, capaz de monetizar, e nesse caso uma monetização que movimenta bilhões, sem se importar com a saúde ou com o bolso do pobre apostador.

Quanto ao novo público ele já é uma geração viciada em telas, e acostumada a passar horas diante da tela dos celulares, o que faz desse novo hábito uma combinação socialmente explosiva.
E as estratégias de marketing, vão do conteúdo, passando pela agregação de celebridades, do meio artístico, musical ou esportiva, tudo vale para fisgar a atenção e o bolso.

No momento em que legalizou as apostas online, desgraçadamente, o poder público replicou o padrão do jogador, e com os olhos vidrados nos ganhos arrecadatórios, fez ouvidos de mercador aos conhecidos riscos da jogatina, do vício à lavagem de dinheiro, passando pela ruína financeira de famílias, fraudes e absenteísmo no trabalho, violência doméstica e prejuízos no varejo, o que já demonstrou pelo uso dos valores do bolsa família em apostas, a necessidade urgente de um freio de arrumação nesse setor.

Quanto a saúde desses jogadores, basta lembrar que segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que até 5,8% da população pode preencher os critérios para o diagnóstico de ludopatia, a compulsão pelo jogo. A porcentagem de pessoas impactadas pela prática é pelo menos três vezes maior, no caso dos jogos online, e o uso de inteligência artificial isso é potencialmente pior.

Tente imaginar, que os algoritmos monitoram comportamentos dos grupos de risco (tipicamente homens jovens de classe média baixa) para turbinar estímulos às apostas e reforçar a compulsão. São comprovadas, por sinal, as associações entre o vício no jogo e o abuso de álcool ou drogas, que se reforçam mutuamente numa espiral de degradação. Uma pesquisa na Austrália estimou 2% dos suicídios associados ao jogo, e é apenas o início.

Existem diversos trabalhos sobre políticas e intervenções eficazes para prevenir riscos e reduzir danos, como, por exemplo, mecanismos de checagem de solvência ou restrições ao acesso, aos gastos e ao emprego de crédito pelos usuários dos aplicativos. Regras de programação podem limitar a exposição dos jogadores a tecnologias desenhadas para excitar emoções autodestrutivas.

Para os casos patológicos, os sistemas de saúde podem ser estruturados para promover intervenções psicossociais e farmacológicas, assim como o ordenamento jurídico pode prever intervenções de parentes para impedir a destruição do patrimônio familiar.

Existe a tecnologia disponível, para ao menos diminuir ou contingenciar o vício, é claro, que tanto o setor quanto os viciados, sempre estarão em busca de maneiras de ampliarem seus lucros e satisfazerem seus vícios.

A tecnologia, instrumentaliza novas forma de manipular e fomentar os lucros criados pela atenção dos jogadores as telas, isso é claro, não é privilégio apenas doa sites de apostas, mas também das redes sociais.

Na economia da atenção/desatenção, tudo vale para converter a sua audiência em mais dinheiro, mesmo que custe a sua saúde ou a sua vida.

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