É preciso ressignificar o transporte público com uso da tecnologia e integrar os modais logísticos
Texto de Charles Machado
O Estado brasileiro que bate recordes sucessivos de arrecadação de tributos, é o mesmo que entrega poucos serviços a uma população cada dia mais pobre. É impressionante, mas nesse momento, os valores da arrecadação dos tributos destinados ao pagamento dos juros da dívida pública são maiores do que todo dinheiro público investido.
Isso mesmo, pasme. Os bancos recebem mais do estado brasileiro, considerando a atual Selic, do que tudo que a União, os Estados e Municípios juntos investem. O restante da arrecadação vai para o custeio e para os vencimentos dos servidores ativos e inativos, ou seja nunca se pagou tanto e se obteve tão pouco de retorno.
Mas qual a relação entre o pagamento de juros da dívida pública, cidades inteligentes e transporte público?
Bem na medida que o Estado brasileiro perde sua capacidade de investimento ele se vê alijado da sua participação executiva da transformação digital nas cidades, deixando de ser protagonista das mudanças, restando a ele o papel de escolher poucos seguimentos para investir e é ai que entra o papel de planejador e de estimulador dos investimentos.
Ele não pode fazer novas estradas e nem investir em modais de transporte público eficiente, porém de custo elevado como metrôs e trens, resta a ele ressignificar o transporte público, e planejar o desenvolvimento dos bairros pensando na logística, fixando as pessoas nos seus bairros de moradia, estimulando atividade financeira nos bairros onde as pessoas estão concentradas e requalificando o transporte público de qualidade. Afinal cada novo ônibus em circulação retira quantos carros de circulação ao longo do dia?
Quantos automóveis retiramos das nossas ruas quando aumentamos a ocupação do transporte público fora dos horários de pico? O que fazemos quando transformamos os locais de estacionamento nas ruas em ciclovias e faixas exclusivas de ônibus? É preciso ressignificar o transporte público com dignidade, e esse é o papel da tecnologia quando por informação integra os modais logísticos.
Logo quando pensamos em cidades inteligentes, aquilo que o Banco Mundial considera conceitualmente, como aquelas que praticam políticas baseadas em intensidade tecnológica e em inovações direcionadas à melhor eficiência dos serviços e do aproveitamento mais sustentável de seus recursos.
A transformação digital, com a incorporação do home office é um senhor estímulo para esse repensar, não apenas a logística das cidades mas o desenhos dos bairros a disponibilização e a oferta de todos os serviços de forma distribuída, evitando deslocamentos desnecessários. Nesse item é preciso dotar todo cidadão de informações online sobre a logística pública para ele decidir pelo melhor modal, de forma integrada.
Nesse momento, no Reino Unido entra em teste o primeiro ônibus autônomo, da empresa Fusion Processing, inicialmente sem passageiros e com um motorista de segurança, em uma rota de cerca de 22 quilômetros. A empresa espera que testes limitados sem passageiros durem cerca de duas semanas, e o serviço regular de passageiros comece por volta do verão. Com capacidade para 60 passageiros e uma ampla gama de sensores que permitem que ele opere completamente de forma autônoma.
A condução autônoma aplicada aos ônibus tem, como tal, muito menos complexidade do que a desenvolvida nos carros: a rota e as paradas são fixas, o que diminui o investimento em microcartografia, também possibilita a implantação de indicações no solo, a marcha não é excessivamente rápida e o tamanho e peso do veículo gera uma sensação de maior segurança para os passageiros.
Obviamente, a operação do ônibus deve levar em conta não apenas as condições de tráfego, mas também possibilidades como o espaço dedicado a parar de ser temporariamente ocupado, ou o tempo adicional que um passageiro, por exemplo, com problemas de mobilidade pode levar para entrar, sentar ou sair do veículo. Além disso, aplicada ao transporte de passageiros, a eficiência do ônibus ou trem é difícil de superar, e embora o custo do motorista do veículo seja diluído por um maior número de passageiros, a economia que pode ser obtida eliminando-o é considerável, e permite uma operação contínua em rotas de alta demanda.
Ônibus autônomos e elétricos com carregamento nas vias é o desenho do futuro, que está bem próximo, pois no Michigan, o governo do estado já autorizou a construção de trechos em estrada para carregamento sem fio para veículos elétricos, carregando os veículos quando estiverem em movimento.
Uma solução baseada no carregamento contínuo enquanto um veículo circula, que poderia ser oferecido como um serviço através de uma assinatura ou integrado ao pagamento de um pedágio para dirigir em uma determinada rota. Sob a superfície da estrada, uma cadeia de indutores passivos permite que os veículos sejam carregados enquanto dirigem (carregamento dinâmico), quando parados no tráfego (carregamento semi-dinâmico) ou quando param em locais convenientemente marcados (carregamento estacionário).
Vivemos em um espaço público que é disputado por todos. E ele é usa do de uma forma muito desigual, e isso já mostra uma inversão de prioridades, com foco no transporte individual.
Enquanto não priorizarmos o transporte público de massa, especialmente os de média e alta capacidade, quem puder escolher o individual o fará, e isso não é apenas uma questão de consciência, mas de necessidade, logo cabe sim ao governo fazer com que a escolha do transporte individual seja penosa, e que o uso do transporte público seja requalificado, utilizado como alternativa e não como falta de opção.
As pessoas precisam migrar para o transporte coletivo e nele se sentirem bem, com conforto e tecnologia embarcada, o que já está disponível.
Conforto, informação e integração digital são os requisitos mínimos para o transporte público dar certo.