Diplomatas brasileiros devem intermediar o conflito territorial entre a Venezuela e a Guiana
Por Misto Brasil – DF
A América do Sul é tradicionalmente palco de poucos conflitos entre nações vizinhas. No entanto, nas últimas décadas, algumas questões envolvendo fronteiras levaram à escaladas militares.
Nestes momentos, o Brasil visto como independente e a principal potência regional, teve papel chave para evitar uma guerra de maiores proporções.
Há 25 anos, o país foi fundamental nos chamados Acordos de Brasília, que colocaram fim a disputas de décadas entre Peru e Equador. É com este retrospecto que especialistas acreditam que o Brasil possa novamente auxiliar na manutenção da paz na região, desta vez entre Venezuela e Guiana.
“O Brasil estabeleceu seu território de maneira pacífica, e sempre buscou deixar a região livre de conflitos”, afirma o jurista e ex-ministro das Relações Exteriores Celso Lafer, anotou a Agência DW.
O professor lembra o começo do século 20, quando o Itamaraty, então comandado pelo Barão do Rio Branco, teve papel fundamental nas constituições das fronteiras dos Estados-Nacionais da região nos atuais moldes de hoje.
Em 2008, uma disputa que também envolveu a Venezuela colocou em risco a estabilidade da América do Sul.
À época, o governo do então presidente colombiano Álvaro Uribe combatia as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), e realizou uma operação militar em território equatoriano.
A questão provocou fortes questionamentos de Quito, com o então presidente Rafael Correa entrando em duros embates com o governo de Bogotá.
Para o professor de Direito Internacional da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) Raphael Vasconcelos, os maiores ativos do Brasil nestes contextos são a tradição do Itamaraty e a qualidade do seu corpo diplomático.
“A postura conciliadora histórica e de neutralidade – interrompida apenas poucas vezes de forma irresponsável ao longo dos anos – dá ao Brasil credibilidade como um conciliador isento”, afirma.
Na recente questão entre Venezuela e Guiana, que disputam a região de Essequibo, Lafer avalia que cabe ao governo brasileiro exercer um papel relevante, lembrando que o país tem fronteira com ambos, e há tratados sobre a Amazônia.
Os presidentes da Venezuela, Nicolás Maduro, e da Guiana, Irfaan Ali, concordaram em realizar uma reunião sobre a recente disputa. A conversa está marcada para quinta-feira (14), em São Vicente e Granadinas, país do Caribe que ocupa a presidência pro tempore da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac).
O governo Lula também participará do encontro, procurando a mediação.
Para Vasconcelos, o foco do Brasil deve ser primeiro o de evitar o agravamento desse conflito no curto prazo – conseguindo, por exemplo, um compromisso do governo venezuelano de não ingressar no território em disputa e que o governo da Guiana não receba forças militares estrangeiras em suas fronteiras.
Nas últimas semanas, autoridades guianenses mencionaram a possibilidade de permitirem a instalação de bases norte-americanas em seu território.
Além disso, o professor acredita que Brasília deve estimular concessões mútuas para que os dois Estados cheguem a um acordo definitivo sobre o conflito.
Em caso de impossibilidade de acerto, cabe ao Brasil garantir que as partes se submetam à institucionalidade internacional – jurisdicional ou não – para neutralizar a crise no longo prazo.