Quando a gente se depara com micro-histórias, percebe-se a presença do construtor de Brasília em mínimos detalhes
Por Sérgio Botelho – DF
Não bastou ao presidente Juscelino Kubitschek arregimentar mundos e fundos, enfrentando obstáculos políticos e econômicos à maneira de um verdadeiro Hércules, embora sem a mesma musculatura física do herói grego, para que o preceito constitucional de erguer uma nova capital no centro geográfico do Brasil se cumprisse.
Mais do que isso, há marcas de Juscelino em detalhes físicos importantes da nova cidade brasileira erguida do nada, do ponto de vista de qualquer vestígio urbano pré-existente. De vez em quando a gente se depara com micro-histórias, como as relatadas por jornais da época, permitindo constatar a presença do construtor de Brasília em mínimos detalhes.
Há um relato feito pelo jornal Estado de São Paulo, edição de 26 de abril de 1960, cinco dias após a inauguração da cidade, quando o presidente resolveu dar expediente direto do Palácio dos Despachos (consagrado hoje como Palácio do Planalto).
Até então, o Palácio da Alvorada servia de local de moradia e de trabalho. Aguardavam-no o arquiteto Oscar Niemeyer e o prefeito Israel Pinheiro.
Depois de escalar ferramentas, resíduos, máquinas e madeirame, e de cumprimentar operários no caminho, o grupo chegou à Sala de Reuniões onde, para serem ouvidos, tinham de falar um pouco alto, pois soavam fortes as marteladas dos trabalhadores em construção.
Juscelino, Niemeyer e Israel se detiveram em um dos janelões que dava para a Praça dos Três Poderes.
À vista do lago, uma ideia já elaborada ainda na Missão Cruls, entre 1894 e 1895, Juscelino decidiu que todo o futuro Lago Paranoá, na planície entre os chapadões Gama e Paranoá, seria iluminado.
Recebeu de Niemeyer a garantia de que a decisão seria cumprida na forma de uma iluminação “dramática, bonita, como um palco”.
Com relação à Praça dos Três Poderes, Juscelino tomou a decisão de proibir qualquer alteração do aspecto daquele logradouro, após concluídos os trabalhos, e que não deveria caber na obra em curso a construção de garagens para veículos.
Determinou ainda a reposição de todo o ladrilhamento em torno do Palácio dos Despachos, além da urgência na pavimentação das vias mais importantes do setor norte da cidade (a Asa Norte do avião), que não contava ainda com nenhuma construção, e a agilização dos serviços de implantação das linhas telefônicas e de águas e esgotos na Asa Sul.
E, ainda, a construção do Iate Clube e da grande antena de rádio e televisão no Eixo Monumental. Assim, Juscelino se fazia presente em cada detalhe da construção de Brasília, até hoje um projeto inacreditavelmente bem-sucedido.
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