Zoo de Brasília – 62 anos de muitas histórias

tigre-de-bengala Dandy
A tigre-de-bengala Dandy que por muito tempo fez a alegria dos visitantes /Zoológico de Brasília
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Texto de Gisella Rodrigues

As máquinas mal começavam a trabalhar no Planalto Central para a construção da nova capital e o primeiro ponto de lazer no Plano Piloto já abria as portas naquela sexta-feira, 6 de dezembro de 1957. Macacos, araras, tucanos e uma elefanta eram as atrações. Inaugurado quase dois anos e cinco meses antes de Brasília, o Jardim Zoológico completa seus 62 anos amanhã (6) como parte importante da história da cidade.

O nascimento do zoológico tem diferentes versões. É conhecida entre os brasilienses a história de que o zoo foi criado para abrigar a fêmea de elefante-asiático Nely que teria sido presente do embaixador da Índia à época ao então presidente da República, Juscelino Kubitscheck. Mas os documentos negam essa hipótese.

O primeiro animal catalogado no Livro de Registros do Zoológico foi um macaco macho da espécie bugio-preto, capturado no Cerrado na área onde estava sendo construída a nova capital e doado por um morador da cidade em 30 de outubro de 1957. Nely é citada em segundo lugar em uma folha rasgada escrita à mão, mas ela não foi um presente do embaixador a JK.

O livro diz que ela foi doada pela Companhia de Produtos Farmacêuticos White Fontoura, de São Paulo, em 6 de dezembro de 1957, data de inauguração da instituição.

Para Igor Morais, gerente de projetos educacionais do Zoológico, a versão do presente do embaixador é uma lenda. “O que parece ser mais coerente é que o zoológico foi criado como atração para os operários que construíram Brasília”, diz. “Isso casa com o fato de o zoológico ter sido inaugurado antes da cidade, o único caso no mundo que eu conheço”, ressalta.

Igor se tornou especialista na história do local. Tudo estava registrado em documentos em armários espalhados pela instituição que ele teve que organizar quando contratado.

“Logo que cheguei aqui recebi a missão de organizar esses armários, que chamávamos de tumba do faraó. Passei quatro meses estudando esses documentos”, conta.

O rato que matou Brasília – Quando o zoológico foi inaugurado, havia basicamente dois recintos no local: o espaço usado por Nely (a elefanta) – ainda de pé, hoje usado pelo rinoceronte Thor – e alguns viveiros para macacos e aves. Não havia cercas nem grama.

Um pouco depois da inauguração, ainda na década de 60, foi construído o Teatro de Arena, usado para apresentações circenses dos animais, o que não é mais feito. Hoje o anfiteatro é usado para palestras e atividades lúdicas para os visitantes. A maior parte da estrutura atual do local é da década de 70.

Originalmente, a área do zoológico era cheia de rochedos que foram dinamitados para fornecer brita para a construção de Brasília. Em uma dessas explosões foi encontrada uma espécie de rato até então desconhecida. Ela foi descrita e batizada como Jucelinomys Candango em homenagem a JK e aos candangos.

Como era uma nova espécie, três “exemplares” foram mandados para o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, e ninguém achou esse tipo de roedor depois aqui na capital. “O parente mais próximo desse rato vive em Goiás, em áreas de rochedo. Acredita-se que o rato literalmente foi explodido junto com os rochedos. A história é conhecida como o rato que Brasília matou, pois a espécie entrou em extinção”, conta o biólogo.

Davino Cardoso da Silva, 80 anos, trabalhou no zoo por 48 anos, de 1967 a 2015. Desempenhou diversas funções, foi servente, motorista, carpinteiro e, nos últimos anos antes da aposentadoria, era tratador das aves. “Fiz de tudo no zoológico, até ajudei a cavar valas. Cuidei praticamente de todos os bichos ali”, conta. “Só ficava meio receoso com o leão. Não gosto de quem fala mais alto do que eu e o rugido do leão é muito alto”, brinca.

O tratador aposentado guarda recordações de uma época em que os animais eram exibidos como bichos exóticos para entretenimento do público e o zoológico vivia cheio. “Teve um Dia das Crianças que estava tão cheio que não tinha espaço nem para pisar”, conta. “Também o zoológico era praticamente a única diversão existente na cidade, tanto para crianças quanto para adultos”, diz.

Elefante Nely/Arquivo Público

Outra mentalidade – Naquela época também era costume capturar animais silvestres da natureza e exibi-los no Zoológico. “Eu nunca fui, mas tinha uma equipe de captura. O pessoal passava meses fora. Lembro quando foram para o Mato Grosso e passaram 90 dias. Assim sempre tinham bichos novos”, fala Davino, apaixonado por animais que comemorou os 80 anos em uma festa com o tema de safari no dia 30 de novembro.

Ele lembra também que os animais eram usados em apresentações circenses que divertiam os visitantes. “A Nely era a grande estrela. Parecia um cachorro de tão dócil”, recorda-se. A elefanta saía do recinto e andava no meio do público. “Ela estava sempre com dois domadores. Aos domingos e feriados eles faziam apresentações como nos circos . Os domadores deitavam no chão e ela colocava a pata em cima deles, parecendo que ia pisar neles”, conta.

A elefanta foi a grande atração do zoológico por 35 anos e a doença dela causou comoção entre os brasilienses, que enviavam cartas oferecendo ajuda para o tratamento do animal. Ela morreu em 1992 – provavelmente por causa da idade avançada, estima-se que ela tinha cerca de 60 anos pois chegou em 1957 já adulta – durante uma visita oficial do ex-presidente da África do Sul, Nelson Mandela, a Brasília.

Outras histórias – Davino conta que havia uma lenda de uma onça que saía do zoológico à noite e teria feito duas vítimas, uma na Velhacap (atual Candangolândia) e outra em Taguatinga. Em 2003, o descuido de um tratador de fato causou uma tragédia que marcou a história do Zoo.

A tigresa Laila escapou e matou um funcionário, Edson Nunes, 29 anos, que alimentava o animal havia três anos. Ele cometeu uma série de erros. Devia ter descido para a área de manejo acompanhado de um colega, mas foi sozinho. Além disso, esqueceu de verificar se as grades de acesso estavam fechadas. O animal chegou a deixar a área de manejo e subir para o espaço dos frequentadores. Mas retornou ao recinto ao ouvir o choro de um dos filhotes.

E quem não se lembra da Capitu. A fêmea de babuíno desafiou seus instintos e aprendeu a nadar para se encontrar com seu amante, Eliseu, em outra ilhota no recinto dos macacos. Seu companheiro, Otelo, assistia tudo de longe e a história foi noticiada por toda a imprensa nacional.

“O Eliseu morreu de tristeza porque colocaram ele longe da Capitu. O Otelo era velho e quem gosta de velho?”, diverte-se o tratador aposentado Davino, que presenciou o caso.

Hoje os tratadores são chamados de cuidadores, porque, além de alimentar os animais e limpar os recintos, eles cuidam do bicho de uma maneira mais ampla, assegurando a qualidade de vida deles.

(Gisella Rodrigues trabalha na Agência Brasília)

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