O médico brasileiro Miguel Nicolelis considera que o Brasil constitui um celeiro de novas estirpes do vírus SARS-CoV-2, causador da Covid-19, e poderá produzir um novo vírus se a doença não for controlada, um ‘SARS-CoV-3’.
“O Brasil virou o foco, o epicentro da pandemia neste momento uma vez que nos Estados Unidos houve uma queda de mais de um terço dos óbitos. O Brasil é o foco [da doença] no mundo”, afirmou o neurocientista em entrevista à Lusa.
Médico e neurocientista, Miguel Nicolelis liderou por 11 meses um grupo de especialistas responsáveis por orientar um consórcio de governadores no Nordeste do país para o combate à pandemia. Também professor da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, já esteve numa lista dos maiores cientistas do mundo, realizada pela revista Scientific American.
À Lusa, Nicolelis afirmou que a nova estirpe registada no país, conhecida como variante brasileira ou amazónica, é mais transmissível e, embora ainda não existam dados confiáveis sobre a sua letalidade – não há certeza se ela é ou não mais mortal do que outras variantes do SARS-CoV-2 em circulação no país – é um sinal de alerta, já que uma transmissão pode provocar o surgimento de um novo tipo de coronavírus.
“O perigo é que nós estamos dando chance para o coronavírus, aqui no Brasil, se replicar e [infectar] entre 70 mil e 80 mil pessoas por dia. Isto gera um número incrível de mutações no vírus. Isto pode dar origem a novas variantes e inclusive, no limite, a mistura do material genético de diferentes variantes pode gerar um novo vírus, um SARS-Cov-3″, explicou.
Nicolelis salientou que o aparecimento de um novo vírus ainda é uma possibilidade teórica, mas há uma probabilidade biológica de que este cenário se concretize.
“Estamos criando um reservatório gigantesco de pessoas infectadas gravemente. Estamos criando [novas estirpes], como esta variante amazónica. É muito provável que nós tenhamos outras variantes surgindo no Brasil, como esta ocorrendo nos Estados Unidos”, afirmou.
“Quando você tem um reservatório humano muito grande de um vírus e o vírus se multiplica demais é inevitável que ocorram mutações por acidente na replicação do vírus. Nós estamos dando para a biologia [o vírus] o que ela necessita para gerar mutações e variantes”, acrescentou.
“No caso [do Brasil] o valor está tão alto, há um crescimento ainda exponencial, que é possível fazer uma aritmética simples. Estamos com mais de 270 mil óbitos, se fizer [um cálculo] com 2 mil óbitos em média por dia, nos próximos 90 dias, haverá 180 mil óbitos. Em três meses batemos 450 mil óbitos. Se houver um colapso completo vai morrer gente e [muitos] nem vão chegar ao hospital”, explicou.
“Se usar uma média de 2 mil a 3 mil [mortes diárias] chega nos quinhentos mil óbitos em 90 dias a partir do final de março. Três meses, entre abril até julho, não tem muito segredo, é aritmética”, avisou. (Do DN)