As propostas mais inovadoras vêm do lado chinês. Essa separação teria múltiplas consequências
Texto de Charles Machado
O atual embate político comercial com a possibilidade de criação de dois padrões digitais para 5G e 6G, pode estar criando no mundo uma divisão entre a zona ocidental e a área orienta, mais avançada de influência chinesa.
Fica cada dia mais evidente que a possibilidade de uma fragmentação dos padrões de telecomunicações móveis do futuro, tanto da fase final do 5G, quanto do incipiente 6G, podem significar que o mundo da tecnologia seria dividido entre o Oriente e o Ocidente, com a concorrência entre “dois ecossistemas”.
Inegavelmente essa divergência trará uma desvantagem para os usuários ocidentais, pois apesar do pesado investimento em 5G nos Estados Unidos, o ecossistema ocidental no curto prazo não conseguirá acompanhar o asiático, se considerarmos os investimentos em P & D na Ásia.
Esse debate, já está sendo feito pela indústria de telecomunicações diante da situação de confronto entre os EUA e seus aliados com a China, especialmente por conta da tecnologia 5G, um confronto que, em sua base, é uma batalha vital para a supremacia tecnológica futura.
Durante os últimos anos, os Estados Unidos mantiveram grande pressão sobre as empresas chinesas de fabricação de telecomunicações, primeiro com a ZTE e depois com a Huawei, chegando a restringir o acesso à tecnologia dos EUA alegando que elas constituem uma ameaça à segurança dos EUA por causa de seus vínculos com o Executivo chinês.
Na mesma linha, os EUA também pressionam governos de todo o mundo a não usar a tecnologia chinesa em suas redes 5G, e como resultado dessa pressão, muitos países já vetaram o uso de equipamentos chineses para suas redes 5G. Na Europa, tudo parece indicar que a Huawei não aumentará mais sua participação e é provável que ela vá para baixo, já que as operadoras reduzem sua presença em suas redes para o que pode acontecer.
Mas, além disso, essa pressão está sendo transferida para os órgãos internacionais de padronização das novas gerações móveis, onde há uma crescente separação entre a tecnologia chinesa e ocidental. Nos grupos em que a Huawei está presente, sendo que nesse momento ela é a maior detentora de patentes para o padrão 5G, os grupos ocidentais não estão presentes e vice-versa.
Se não bastasse, as operadoras ocidentais pertencem a grupos de desenvolvimento nos quais a Huawei também está presente, e eles acabam sendo pressionados a abandoná-los.
As propostas mais inovadoras vêm do lado chinês, pois desde de que o 4G chegou, a China está nesses setores, à frente do Ocidente, uma vantagem que está se expandindo em grande velocidade com o 5G, dada a sua implementação maciça na China que já tinha cerca de 450 milhões de usuários 5G no final de junho.
A importância estratégica do 5G será enormemente maior do que a de seus antecessores, pois será o sistema nervoso no qual toda a transformação digital do futuro será implementada, especialmente em fábricas e serviços. É justamente por isso que muitos dos serviços B2B (para empresas) destinados a fabricantes ou empresas de serviços e que têm a ver com automação e robótica maciça já estão sendo desenvolvidos na China, e não no Ocidente.
Essa separação tecnológica em dois ecossistemas que não são compatíveis entre si teria múltiplas consequências, mas um deles, e não o mais grave, será o provável aumento do preço dos equipamentos, tanto redes quanto móveis, já que as economias atuais de escala que a existência de um único padrão 4G agora proporciona são volatilizadas.
Como resultado, a indústria do ocidente será ainda mais lenta, logo menos competitiva, gerando menos resultado e perdendo a sua supremacia tecnológica.
(Charles Machado é advogado e consultor com atuação em São Paulo e Florianópolis)