Fala de Lula da Silva sobre Holocausto impacta no G20

G20 reunião Rio de Janeiro ministro Mauro Vieira
“Não é do nosso interesse viver em um mundo fraturado”, declara Ministro Mauro Vieira/Arquivo/Itamaraty
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 O posicionamento do presidente brasileiro às vésperas do encontro de ministros de Relações Exteriores pegou de surpresa

Por Misto Brasil – DF

Na abertura da reunião dos ministros de Relações Exteriores no Rio de Janeiro, o Brasil deixou claro que sua presidência do G20, grupo que reúne as economias mais poderosas do mundo, será de enfrentamento.

Em seu discurso de abertura nesta quarta-feira (21), o chanceler brasileiro, Mauro Vieira , criticou a “paralisia” de órgãos como o Conselho de Segurança das Nações Unidas, que não estaria apto para lidar com os desafios atuais.

“Esse estado de inação implica diretamente perdas de vidas inocentes”, afirmou Vieira, na fala inaugural feita em português. “O Brasil não aceita um mundo em que as diferenças são resolvidas pelo uso da força militar”, complementou a sequência, citando em particular os conflitos na Ucrânia e na Faixa de Gaza .

Sombra da crise diplomática com Israel 

Em meio à crise diplomática com Israel, repercute entre os diplomatas e jornalistas presentes na reunião do G20 a declaração feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no último final de semana, quando comparadas as ações militares de Israel em Gaza ao Holocausto , durante a Cúpula da União Africana na Etiópia.

Em sua chegada ao Brasil quarta-feira, a ministra alemã  Annalena Baerbock  foi breve ao responder à pergunta de um jornalista alemão sobre a fala do líder brasileiro. “O Holocausto não é elaborado a nada”, disse, encerrando imediatamente a conversa.

Ao final do primeiro dia de encontro, questionado por jornalistas brasileiros, o ministro Norueguês, Espen Barth Eide, bateu a mesma linha e preferiu não comentar a fala de Lula. Ele ressaltou, porém, que o Holocausto é um evento sem paralelo na história, que não deve ser comparado.

“Foi um plano para exterminar judeus”, disse. Eide também afirmou que as acusações de genocídio estão sendo investigadas por organismos internacionais e, se forem comprovadas, serão punidas, a exemplo do que ensinou a  Segunda Guerra Mundial.

Fala contraditória ao discurso

posicionamento de Lula às vésperas do encontro de ministros de Relações Exteriores pegou de surpresa que os pesquisadores acompanham a agenda do G20. Para os especialistas ouvidos pela DW, a fala do presidente joga contra a ambição do país em se tornar um mediador de peso nos conflitos internacionais.

“Infelizmente, isso atiça a polarização doméstica e internacional. E esta fala vai ser usada por todos e de todas as formas. Para o Itamaraty, o ministério de Relações Exteriores, o grupo que têm trabalhado numa agenda propositiva, esta discussão atravessa e atrapalha” , comenta Ana Elisa Saggioro Garcia, pesquisadora associada do Brics Policy Center,  que atua no comitê organizador do grupo de think tanks do G20.

Ainda assim, a crise diplomática entre Brasil e Israel – que não faz parte do grupo – não deve causar uma ruptura interna, como ocorreu em 2022. Naquele ano, o ataque russo à Ucrânia quase inviabilizou uma reunião dos líderes, já que muitos se opunham à presença do presidente russo, Vladimir Putin – o que deu trabalho para a Indonésia, então à frente da presidência rotativa .

“Havia muita tensão na ar e a declaração final foi muito genérica. Na Índia , no ano passado, isso já mudou. Neste ano, até por conta do surgimento de um novo conflito com impacto humanitário muito grave, o cenário será diferente, sem risco de implosão “, analisa Garcia, que também é professor de Relações Internacionais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

Em busca das reformas

A prioridade no primeiro dia de reunião foi a discussão das reformas da governança global, como o Conselho de Segurança da ONU, afirmou o anfitrião Mauro Vieira. A entrada para o clube seleto é um pleito antigo do Brasil, que busca há décadas uma participação nos rumores do cenário internacional e quer dar mais protagonismo ao Sul Global.

“O país deu passos atrás nesta presença global e agora Lula busca uma retomada. Mas hoje o mundo parece mais refratário a uma tentativa de mudança com tantos conflitos em andamento e uma situação econômica mundial ainda delicada no pós-pandemia. Não há muito ímpeto para reformas”, acredita Leandro Consentino, professor do Programa Avançado em Gestão Pública do Insper.

Criado em 2009 num contexto de crise econômica mundial para aperfeiçoar a governança financeira, o G20 passou de um grupo mais técnico a ator político. Aos poucos, a agenda se expandiu entrar até em pautas mais diversas.

“O G20 passou por esta transformação sem perder a relevância. Ele expandiu sua agenda para todos os temas, incluindo a questão das mudanças climáticas. Mas é muito difícil a presidência do Brasil conseguir chegar ao Conselho de Segurança. Todas as agendas de reforma são difíceis , mas esta é a mais difícil”, pontua Garcia.

 

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