Demonstra o impacto negativo que a falta de reconhecimento e suporte gera para as mulheres, limitando suas oportunidades econômicas e de carreira
Por Clarice Binda – MA
Em todo o mundo, as mulheres desempenham um papel desproporcional como cuidadoras. São elas que, como podemos ver ao nosso redor, são as responsáveis pelo cuidado de crianças, parentes idosos ou dependentes acometidos de alguma doença.
Isso se reflete tanto no âmbito familiar quanto no profissional, com mulheres dominando setores como enfermagem, educação infantil e assistência social.
A economia do cuidado refere-se às atividades de apoio a pessoas dependentes, como crianças, idosos e pessoas com deficiência, incluindo cuidados de saúde, nutrição e apoio emocional.
Esse trabalho, em grande parte não remunerado, sustenta tanto a economia de mercado quanto o Estado, pois é impossível conceber a existência e a reprodução da sociedade sem o mesmo, no entanto, é frequentemente invisibilizado nas estatísticas econômicas convencionais.
A desvalorização do trabalho de cuidado reflete-se em desigualdades de gênero. Segundo dados da Oxfam (2020), as mulheres são responsáveis por três quartos do cuidado não remunerado e compõem dois terços da força de trabalho de cuidado remunerado. Isso demonstra o impacto negativo que a falta de reconhecimento e suporte gera para as mulheres, limitando suas oportunidades econômicas e de carreira.
Assim, mulheres não podem progredir em suas carreiras porque, enquanto a maioria dos homens não se preocupa com o trabalho que vem depois do expediente do trabalho remunerado, tais como cuidar da casa, dos filhos e demais dependentes, as mulheres recusam promoções e trabalhos extras para poderem se dedicar ao trabalho de cuidado que as espera após o expediente.
Uma das abordagens propostas pela Oxfam para resolver essas disparidades é conhecido como “4R”: reconhecimento do valor do cuidado, redução da carga de trabalho não remunerado, redistribuição das responsabilidades entre gêneros e esferas públicas e privadas, e representação das cuidadoras nos processos decisórios.
Falta de representatividade nos cargos de comando
Nesse intuito, a Associação das Mulheres Defensoras Públicas do Brasil (Amdefa), entidade de âmbito nacional que congrega mulheres defensoras públicas dos estados, Distrito Federal e da União, tem como campanha atual a discussão da política de cuidados dentro das Defensorias Públicas de todo o Brasil.
Isso porque, sem a existência de um Conselho Nacional da Defensoria Pública, como ocorre no Poder Judiciário e no Ministério Público, há uma variedade de regras entre as Defensorias, de forma desigual.
Essa falta de padronização do reconhecimento e valorização do trabalho de cuidado nas Defensorias Públicas em relação às suas membras reflete num dado real sobre a participação das mulheres defensoras nos cargos de alto escalão dentro da instituição.
Apesar de as defensoras mulheres representarem mais da metade dos membros da instituição em todo o país (51%, conforme última Pesquisa Nacional da Defensoria Pública de 2022), apenas 40% chefiam as Defensorias Públicas como Defensoras-Gerais, recorde histórico de liderança feminina nas Defensorias.
Além disso, somente 18% das Corregedorias Gerais tem mulheres defensoras à frente, e nos Conselhos Superiores, os homens são maioria em mais de 70% dos colegiados que definem os rumos da instituição.
É no intuito de trazer à tona tal discussão, em nível nacional, que a Amdefa realizará, no dia 19 de novembro, na cidade de Brasília, o seminário “Definindo o cuidado como justiça” que visa fortalecer a rede de proteção aos direitos das mulheres nas carreiras do serviço público com escopo nos deveres de cuidado, sua compatibilização com a vida profissional e a necessária adaptação das instituições para reconhecer cuidados domésticos como trabalho.
A ministra do Supremo Tribunal Federal, Carmen Lúcia, única mulher que compõe a Suprema Corte brasileira, apoiadora e entusiasta da Associação, fará a palestra de abertura do evento, que reunirá representantes de toda a rede de mulheres nas carreiras do serviço público e líderes de organizações relacionadas ao tema, com o objetivo de promover a equidade e a justiça social.
Um dos desafios atuais da sociedade brasileira é reconhecer que o trabalho de cuidado é não apenas uma questão de justiça social, mas também de desenvolvimento econômico e bem-estar. Políticas que valorizem o cuidado e promovam a igualdade de gênero são fundamentais para uma sociedade mais justa e inclusiva, inclusive dentro das Defensorias Públicas.