Canadá e retórica da fanfarronada trumpista

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Fronteira entre o Canadá e os Estados Unidos que ficou temporariamente fechada/Arquivo/Reprodução X
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O presidente eleito, Donald Trump, parece ter entrado nesse espírito de acusar o vizinho pela imigração ilegal e narcotráfico através de sua fronteira setentrional

Por Misto Brasil – DF

“A culpa é do Canadá!”, diz o refrão de uma canção do filme de animação americano South Park: maior, melhor e sem cortes, de 1999, em que uma mãe conclama sua cidadezinha do Colorado a combater a degeneração da juventude.

Satiricamente, a letra acusa o vizinho ao norte dos Estados Unidos, em vez das políticas nacionais, erros de educação familiar ou influência da mídia, declarando: “Temos que preparar um ataque total: é culpa do Canadá!”, escreveu Nik Martin, da Agência DW.

Mais de duas décadas depois, o presidente americano eleito, Donald Trump, parece ter entrado nesse espírito, acusando o vizinho pela imigração ilegal e narcotráfico através de sua fronteira setentrional. E, apenas semanas após vencer as eleições para um segundo mandato na Casa Branca, ameaçou impor taxas aduaneiras de 25% a todas as importações canadenses, a partir de seu primeiro dia no cargo.

Desde então, Trump acirrou sua retórica, brincando que o Canadá poderia ser anexado como 51º estado americano. E chegou a zombar do primeiro-ministro Justin Trudeau – que renunciou devido às taxas de aprovação em declínio –, chamando-o de “governador” do “Grande Estado do Canadá”.

Enquanto para alguns analistas tal retórica não passa de mais uma fanfarronada trumpista, políticos e economistas canadenses condenaram amplamente as assertivas. Ainda mais porque o país nunca foi alvo da campanha presidencial do republicano – ao contrário da China, México, Brics e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

“A coisa veio como um relâmpago em céu azul”, registra Douglas Porter, economista-chefe do Banco de Montreal (BMO).

“Não havia entre os apoiadores dele nenhuma corrente tachando o Canadá de grande vilão. Então eu acho essa tirada ainda mais desconcertante.”

Porter vê a argumentação de Trump mudando à medida que ele se prepara para assumir em 20 de janeiro:

“De início havia ressalvas sobre a fronteira, as quais eu acho que o Canadá bem gostaria de abordar. Depois a questão era o desequilíbrio do comércio EUA-Canadá. E na coletiva de imprensa do outro dia, Trump falou de impor penalidades econômicas ao Canadá.”

Apesar de ter defendido e assinado o Acordo EUA-México-Canadá (USMCA), em vigor desde 2020 e sujeito a revisão em 2026, Trump agora alega que os países cossignatários falharam em cumprir termos-chave do pacto que vão do controle de fronteiras ao comércio.

Canadá primeiro-ministro Justin Trudeau Misto Brasil
Justin Trudeau é atualmente o primeiro-ministro do Canadá/Arquivo/Divulgação

Ottawa se prepara para retaliar

O Partido Liberal do Canadá não elegerá o novo primeiro-ministro sucessor de Trudeau até 9 de março. Embora a renúncia de Trudeau deixe o país sem liderança política, seus legisladores já elaboraram uma lista de importações americanas sujeitas a retaliação, caso Trump prossiga com seu plano de taxação alfandegária.

Economistas preveem que os afetados serão produtos americanos política e economicamente sensíveis, como ocorreu numa disputa comercial semelhante em 2018, durante o primeiro mandato de Trump, resolvida um ano mais tarde.

O jornal The Global & Mail noticiou que Ottawa estaria considerando taxar aço, cerâmica, vidro, flores e suco de laranja americanos, entre outras mercadorias.

Tony Stillo parte do princípio de que o lado canadense “só identificou um punhado de setores porque não quer colocar ainda tudo na mesa, minando a sua posição de negociação”.

Contudo, tendo só fanfarronices e ameaças absurdas para se basear, cabe ainda à liderança canadense descobrir o que, exatamente, Trump está buscando. Trata-se de uma tática de negociação para fortificar o controle fronteiriço, intensificar a cooperação energética e automotiva, ou fazer o Canadá aumentar suas contribuições para a Otan?

“Não estamos tratando com um conjunto de medidas esclarecido, em passos sucessivos”, frisa Huggins. “Estamos tratando com um valentão da escola que diz: ‘Me dá o teu dinheiro do lanche’, então provavelmente vamos ter que entregar as moedas que temos nos bolsos.”

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