O brasileiro quer uma reforma tributária que contribua para reduzir a desigualdade socioeconômica
Por Charles Machado – SC
Não há um só brasileiro que duvide da necessidade de uma reforma tributária, logo sua urgência não pode ser confundida como apressada ou sem discussão. Desde 2003 o Congresso brasileiro já trata do assunto, ou seja nas duas últimas décadas o assunto foi discutido por toda sociedade brasileira m maior ou menor intensidade.
Apenas pra termos ideia dessa discussão, que se acentuou com duas propostas de EC, desde maio de 2019, a ideia de uma reforma tributária já foi discutia em 74 eventos públicos no Congresso. Eventos que tratavam das duas propostas, que estão sendo consolidadas pelo relator, deputado Aguinaldo Ribeiro.
Logo de forma transparente e democrática o Brasil deve votar ainda no mês de julho a primeira das reformas no sistema tributário, desde a Constituição de 1988.
O relatório do deputado, mantém boa parte do espírito da reforma, que pode levar o Brasil a uma simplificação inédita de cinco impostos e suas infindáveis alíquotas em apenas um tributo.
Na consolidação das duas propostas de Emenda Constitucional que tratam da Reforma, o relatório deve através de uma simbiose das duas propostas, prever alíquotas diferenciadas para alguns bens e serviços, ainda que se sem especificar quais seriam. Destaco aqui que ao encurtar o tempo entre a apresentação do relatório e a sua votação, devemos por conclusão ter a proposta aprovada.
Como adiantamos em outros artigos, longe do ideal mas dentro do possível e necessário.
Lembro por último, que estão mantidas duas grandes exceções: o Simples Nacional, numa faixa de faturamento além do razoável, e a Zona Franca de Manaus, que foi renovada por 50 anos, o que nesse ponto é bem curioso, pois como vai se manter benefícios sobre tributos que não existirão mais?
Economia digital e a desigualdade socioeconômica
A transformação digital das nossas rotinas, com novas formas de se adquiri serviços e mercadorias, por si só já seria motivo para uma grande reforma. Imagine seguirmos com um sistema onde a publicidade na TV está sujeita, ao IRPJ, CSSL, Cofins, Pis, ISS, INSS e a publicidade digital, em plataformas e redes sociais sofre uma tributação de poucos tributos, uma vez que o seu modelo de negócio não está previsto na Legislação.
Comprovadamente a economia digital amplia a concentração de renda, saem velhos barões e entram os novos, donos de plataformas e redes sociais. Com instrumentos de tributação arcaicos, os barões da tecnologia são privilegiados, o que só amplia as desigualdades.
Conforme uma pesquisa do Instituto Ideia, o brasileiro quer uma reforma tributária que contribua para reduzir a desigualdade socioeconômica do País, eleve o imposto sobre os mais ricos e não aumente a carga de impostos, só falta combinar com os mais ricos que exercem sua influência no Congresso.
De acordo com a pesquisa, 56% dos entrevistados dizem que a reforma deve contribuir para reduzir as desigualdades, e entendem que ela deve pesar menos sobre o consumo de bens de primeira necessidade e mais sobre itens que evidenciem riquezas, como helicópteros e mansões, ou sobre grandes fortunas.
Lembrando que a proposta de reforma contempla a adoção de um sistema de cashback, que é a devolução de parte de impostos para famílias de baixa renda.
Destaco o fato de que nas últimas três décadas o Brasil passou a orbitar entre as 10 maiores economias do mundo, chegando a ocupar a 6ª colocação e caindo no ano de 2022 para a 14ª. empatado com o Irã.
Lamentavelmente, apesar de sermos um país pacífico sem guerras ou conflitos, uma nação rica em recursos naturais e em diversidade cultural e biológica, nos colocamos entre os mais desiguais, desigualdade essa que deve se acentuar se não intervimos na lógica da economia digital, que é concentradora de renda.
Crescimento sem distribuição
Sabidamente os diversos programas sociais ajudaram a reduzir a desigualdade, mostra o IBGE, mas a superação real da pobreza depende de um setor privado competitivo e de um poder público eficiente, com menos privilégios para umas poucas categorias e com uma carga tributária que onere menos a produção, e que seja justa na sua distribuição.
O Índice de Gini, que mede a desigualdade de renda, numa escala de 0 a 1, recuou de 0,544 para 0,518, o que representa segundo os cálculos da FGV Social, que a pobreza diminuiu de 14% para 9,6%.
Porém, uma diminuição que estava umbilicalmente ligada aos programas sociais. Muitos brasileiros precisam de muito pouco para saírem da linha da miséria, e isso pode ser feito por medidas emergenciais, mas elas precisam ser vistas como transitórias e passageiras para a maioria desses.
A verdadeira transformação se dá, em um Estado de bem estar social, que se mede pela quantidade de pessoas que ele emancipa e não pelo número daqueles que ele torna dependente pela necessária e urgente assistência. Crescimento sem distribuição, é apenas a perpetuação da miséria e do clientelismo, tão útil em períodos eleitorais, mas que cobram seu preço.
Segundo alguns trabalhos já publicados, dado repetido pelo secretário extraordinário do Ministério da Fazenda para o tema, Bernard Appy, o Brasil é hoje 20% mais pobre do que deveria ser em razão das distorções do sistema tributário, que reduzem a produtividade e a renda dos brasileiros.
A complexidade do nosso atual sistema, ao lado da carga tributária elevada, se traduz no seu calcanhar de Aquiles, que bem pode ser exemplificado pelo ICMS, onde com 27 legislações diferentes, que se multiplicam em milhares de normas fiscais derivadas da sua competência impositiva, transforma a vida do contribuinte com atuação nacional, um verdadeiro inferno.
Novas alíquotas e a tendência de errar para cima
As PECs, hoje em tramitação, ainda estabelecem um grande período de transição, com a convivência entre os tributos que serão substituídos no tempo pelo novo imposto a ser criado. Vai aumentar a complexidade dos contribuintes no cumprimento de suas obrigações acessórias e principais, o que vai fazer com que o sistema ainda por um curto período se mantenha bastante complexo.
Outro elemento que devemos esperar, reside na dificuldade dos Fiscos em estabelecer alíquotas que sejam de fato neutras. A tendência de errar para cima, com receio da perda de receitas.
A questão dessa calibração é saber quando reduzir, depois que se acostuma com um nível de arrecadação elevado. Buscar a neutralidade sem aumento de carga, será um senhor desafio, pois afinal qual carga será a referência para aferição da neutralidade?
A reforma dessa vez parece certa, e o Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS) segue sendo o modelo de Imposto sobre o Valor Adicionado (“IVA”), que para referência é atualmente adotado em mais de 168 países. Não estamos reinventando a roda, mas seguindo modelos existentes, partindo da experiência dos outros, com seus erros e acertos, o que é o melhor caminho.