Com um grande serviço prestado às artes do Distrito Federal, o artista estava em Parnaíba, onde foi encontrado em seu ateliê
Por Misto Brasil – DF
O arquiteto João Galeno confirmou nesta tarde a morte do pai, Francisco Galeno, que foi um artista bastante respeitado no Distrito Federal. O corpo dele foi encontrado no seu ateliê, em Paranaíba, no litoral do estado do Piauí. Atualizado às 19h55
O artista tinha 68 anos e estava com dengue, segundo informou a família. Era conhecido por unir o lirismo popular do Piauí à estética modernista de Brasília.
Galeno é autor do painel da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, na 308 Sul, e deixou sua marca em espaços públicos do Distrito Federal.
Nascido em Parnaíba, no Piauí, e radicado no Distrito Federal desde os anos 1960, Galeno foi um dos artistas mais representativos da capital.
No site Visite Brasília há um depoimento do artista, que era filho de pescador e a mãe costureira. O avô produzia selas e arreios de couro. Cedo começou a pintar depois de visitar exposições. Ele atuou em várias direções: escultura, roupas, instalações.
“Na minha arte não entra um prego que não seja carregado de história afetiva”.
“O camaleão foi um bicho que influenciou muito a minha pintura. Ele muda de cor para escapar do bicho predador”.
“A camisa do Brazlândia não tinha identidade. Um jogo de futebol é como se fosse uma exposição para milhares de pessoas”.
“A ideia surgiu de minhas viagens de carro para o Piauí, onde eu sempre encontro esses loucos de BR. São artistas, sempre juntam algum objeto para se enfeitar”.
“Quero também fazer uma roupa muito louca, com um chapéu colorido e usar latas de sardinhas e anzóis como adereços. Vou combinar com as crianças para que elas me acompanhem pelas ruas, soltando pipas no ar.”
Pertil do artista
O piauiense Francisco Galeno foi criado em Brazlândia, onde mantém seu atelier, utilizado nos períodos de visita aos familiares. Vive e trabalha em sua cidade natal, sendo um dos artistas de Brasília que alcançou maior reconhecimento no País. Sua arte camaleônica é, para os olhos, uma verdadeira festa popular brasileira: “O camaleão foi um bicho que influenciou muito a minha pintura. Ele muda de cor para escapar do bicho predador”. Assim, também, seu trabalho se metamorfoseia, ganha uma nova pele, incorpora uma nova modulação de cores.
A arte entrou em sua vida pelo sangue, uma vez que teve a sorte de nascer em uma família de artesãos. Seu pai foi pescador e fabricava canoas, enquanto sua mãe era costureira e rendeira e o avô, vaqueiro, preparava selas e arreios de couro. Ainda muito jovem Galeno resolveu pintar e passou a frequentar exposições nas galerias da capital, a olhar revistas e a pesquisar em livros, arriscando as primeiras cores. No princípio seus assuntos eram a paisagem e a figura humana, mas logo entendeu que estava repetindo uma tradição milenar da arte:
“Percebi que para encontrar um caminho próprio eu teria que olhar para dentro de mim e recuperar a minha infância às margens do Rio Parnaíba. Então, comecei a trabalhar com os carretéis que a minha mãe usava, com os anzóis do meu pai, com os carrinhos de lata de sardinha que a gente fazia”.
O trabalho de Galeno está em sintonia direta com a tradição da arte construtivista brasileira de Alfredo Volpi e Rubem Valentim, tradição essa que trabalha as formas geométricas, a síntese, a abstração, em detrimento das figuras. Mas não se trata de uma geometria cerebral e fria. Ele trabalha com a alegria de um “curumim arteiro”, propondo novos jogos para suas peças, brincando com as formas e com as cores:
“Apesar de toda precariedade, eu tive a sorte de nascer às margens do Rio Parnaíba. Eu nem sei como aprendi a nadar. A gente entrava no rio e de repente percebia que sabia se virar na água. A família organizava muitas festas. A minha pintura tem essa alegria, esse desejo de felicidade do povo, da alma brasileira. Esse é o lado bom do Brasil”.
Em 1965 Galeno desembarcou em Brasília, para morar no acampamento da Civilsan, firma em que seu pai trabalhava. Era uma invasão. Em 1969 um caminhão despejou a família de Galeno no meio do poeirão de uma rua de Brazlândia. Apesar de ser um artista reconhecido nacionalmente, Galeno faz questão de continuar ainda hoje morando em Brazlândia e de ser considerado um artista da cidade. Ele conhece cada palmo de Brazlândia:
“Não adianta morar em Brazlândia e falar sobre Paris. Eu cresci tomando banho de cachoeira, descobrindo lugares escondidos. Esse lado esquecido do Brasil é o que o país tem de melhor”.
Galeno não é apenas pintor. Ele atua em várias direções: escultura, roupas, instalações. Quando era moleque, seu sonho era ser jogador de futebol e recentemente desenhou uma camisa para o time do Brazlândia: “A camisa do Brazlândia não tinha identidade. Um jogo de futebol é como se fosse uma exposição para milhares de pessoas”. Em seguida trabalhou em um projeto para homenagear os loucos de estrada, que ele chama de “loucos de BR”.
O trabalho é inspirado no artista Arthur Bispo do Rosário: “A ideia surgiu de minhas viagens de carro para o Piauí, onde eu sempre encontro esses loucos de BR. São artistas, sempre juntam algum objeto para se enfeitar. Quero também fazer uma roupa muito louca, com um chapéu colorido e usar latas de sardinhas e anzóis como adereços. Vou combinar com as crianças para que elas me acompanhem pelas ruas, soltando pipas no ar.”
(Texto do perfil na Referência – Galeria de Arte)